Exposição – Botannica Tirannica

13/09/2023

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A TAXONOMIA DO PODER

GISELLE BEIGUELMAN é reconhecida por investigar de forma inventiva a interseção entre arte, tecnologia e sociedade a partir de reflexões sobre questões da contemporaneidade que perpassam suas obras. Ao adentrar o universo das imagens e da botânica, a artista busca a ressignificação e redefinição da essência desses elementos visuais e da linguagem que os permeia, compreendendo seu papel e impacto nas dinâmicas sociais. Sua abordagem crítica questiona o legado do colonialismo e das estéticas que subjugaram não apenas corpos, territórios e imaginários, mas também a natureza.

Em BOTANNICA TIRANNICA, Beiguelman explora o território da ciência e interroga as relações entre a botânica clássica, a ciência hegemônica e o imaginário colonialista, historicamente presentes nas formas de dominação da natureza, sendo a própria ideia de natureza uma invenção da modernidade. Imaginário este que naturalizou o racismo e o preconceito contra mulheres, negros, indígenas, judeus, povos rom, sinti e caló (“ciganos”) e tantos outros grupos, como pessoas LGBTQIA+ e idosos, continuamente desqualificados e reprimidos por meio de nomes científicos e populares discriminatórios e pejorativos, presentes na nomenclatura científica.

Não por acaso, o gatilho para este projeto se deu quando a artista ganhou de presente uma muda de Tradescantia zebrina, popularmente conhecida como “judeu-errante” em vários idiomas e países. Expressão depreciativa que designa uma planta que insiste em sobreviver e se difundir mesmo diante de condições adversas, incorporando um tipo de associação que se repete em outros grupos sociais. Tal é o caso da Thumbergia alata, conhecida popularmente como “bunda-de-mulata”; da Senecio jacobsenii, vulgarmente conhecida como “trança-de-cigana” e da Impatiens walleriana, a popular “maria-sem-vergonha”. Esses são exemplos de alcunhas típicas de plantas consideradas, em diversas culturas e línguas, “daninhas” ou “infestantes”: aquelas que, na condição de intrusas, rebeldes e indesejadas, provocam dano, não servindo ao extrativismo colonialista e, por isso, condenadas à danação, às penas do inferno. Como defende o pensamento eugenista moderno, “a humanidade é um jardim”, de onde as ervas daninhas (indomáveis) devem ser eliminadas.

Em sua pesquisa, a artista, que já mapeou centenas de espécies de plantas submetidas à nomeação pejorativa, produz estéticas que funcionam como um contradiscurso a essas linguagens hegemônicas, pois resultam em um verdadeiro jardim decolonial – uma pós-natureza gerada com recursos de inteligência Artificial, usados para cruzar diversas espécies dotadas de nomes preconceituosos, investigando e subvertendo as taxonomias e os padrões algorítmicos que sustentam o ideário colonialista que se projeta no colonialismo dos dados.

Por meio de suportes distintos – incluindo uma série de 18 impressões, cinco vídeos e um ensaio audiovisual –, a artista subverte os usos correntes da tecnologia, criando novos sentidos poéticos e novos significados políticos e sociais. Surgem assim criaturas híbridas, surpreendentes e desconcertantes, plantas ao mesmo tempo reais e imaginárias, verdadeiras e fictícias, que confundem a tal ponto que desarticulam a tendência taxonômica por meio de seus corpos estranhamente familiares, de sua plasticidade e de suas nomenclaturas intrigantes e impronunciáveis, dando forma a um jardim digital híbrido que se revela nas obras Flora mutandis e Flora rebellis.

BOTANNICA TIRANNICA convida os diferentes grupos sociais a adentrarem o espelho da linguagem no intuito de ampliarem a percepção que têm de si mesmos, do outro e de suas práticas cotidianas e coletivas de exclusão, focando formas de vida resistentes e resilientes. Mobilizando criaturas naturais e artificiais infiltradas em jardins reais e digitais, as obras revelam a dimensão colonialista e reconceituosa das nomenclaturas científicas e populares e se mostram primordiais para a ruptura dos binarismos impostos, das identidades fixas, das forças taxonômicas e das políticas de dominação e segregação.

ALINE AMBRÓSIO – CURADORA

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Visitação

21/9/23 a 25/2/2024

Terças a sextas

9h às 21h30

Sábados, domingos e feriados

10h às 18h30

Agendamentos de Grupos

exposicao.taubate@sescsp.org.br

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