A paixão de Ari Protázio, pianista e cantor, começou ainda cedo no Instituto Padre Chico, especializado no ensino para crianças e adolescentes com deficiências visuais, fundado em 1928. O seu primeiro contato com o instrumento aconteceu aos 9 anos, abrindo para ele um novo caminho para a vida.
Para aprender música, uma pessoa cega segue os mesmos caminhos que um vidente – pessoa com percepção visual plena -, podendo ser o do ensino tradicional, com aulas de teoria e leitura em partituras. Seguindo por esse caminho, há necessidade de adaptação para a musicografia Braile, que auxilia na leitura dos códigos musicais escritos. Vale ressaltar que, embora exista o recurso assistivo, durante uma apresentação o músico cego é mais exigido. “Se um a pessoa for ler uma peça clássica, o músico cego tem que ler a partitura e decorar tudo, para executar”, já que o músico vidente conta com a partitura para leitura em tempo real.
O outro caminho de aprendizado, seguido por Ari, é intuitivo e conta com a audição. “Eu, como músico popular, nunca tive paciência de aprender a musicografia braile, eu usei muito o meu ouvido e sensibilidade, então o aprendizado para deficiente visual e vidente requer só uma coisa, a vontade de aprender, pois os caminhos deles podem ser um pouco diferentes, mas o resultado final é o mesmo, ou toca ou não toca,” relata Ari.
A experiência de Ari Protázio na música passou por diversas áreas. No começo, foi vendedor e demonstrador de pianos, em seguida, tocou na noite, e até acompanhou um músico sertanejo famoso na década de 90. Mas o momento marcante aconteceu com o Arte nas ruas, projeto cultural da Prefeitura de São Paulo, realizado em 1996. “Eu era contratado para fazer show das 12h às 13h em praças. Isso para mim foi marcante, pois, até então, eu estava acostumado com barzinho, eventos e festas. Mas nunca tinha contato com todo tipo de pessoas que você possa imaginar, e rua é isso. Ela nos traz uma liberdade fantástica e ensinamento. Ali, eu conheci muito bem o que é tocar para todo tipo e classe social, ao mesmo tempo, do mesmo jeito que tocava para um executivo, tinham pessoas em situação de rua”, relembra o músico.
Durante o ano que Ari tocou nas praças, muitas pessoas perguntavam se ele tinha algum material gravado. Diante desses constantes pedidos, deu início ao processo de gravações. Nesse momento, de maneira caseira, o músico gravava durante a noite fitas K7 (padrão de fita magnética para gravação de áudio), com versões de clássicos da música popular.
Essa experiência foi o início para o álbum “Pedaço de Mim”, lançado em 2000. O trabalho é focado no estilo da música popular brasileira, contando com composições de diversos amigos do músico e mais de 20 profissionais. Sobre esse período Ari relata que “nesse trabalho, além de ser minha primeira gravação, eu aprendi muito, e isso me instigou em produzir os meus futuros trabalhos”. A partir disso, Ari se estruturou e atualmente possui um estúdio que grava outros artistas, como também audiobooks.
O músico relata como o profissionalismo é importante para mudar paradigmas a respeito do campo de ação da pessoa com deficiência. “Quando uma pessoa me contrata, para produzir um jingle, um trabalho, dirigir um cantor dentro do estúdio, muitas vezes, essa pessoa não sabe que eu não enxergo, quando a pessoa chega no estúdio, a pessoa já dá aquela olhada, que você nem precisa ver para saber o que a pessoa está pensando – ‘Meu Deus, ele não enxerga! O que será que vai acontecer?’. Porém, com o processo de trabalho, onde Ari, apesar de não enxergar, deixa o monitor ligado, o cliente acompanha como o produtor capta e edita o áudio e assim quebra barreiras a respeito de sua capacidade.”
Para Ari, projetos que proporcionam espaço para artistas com deficiência mostrarem seu trabalho é importantíssimo, pois fortalecem a luta da pessoa com deficiência. “Essa luta é de vários anos. Eu digo para você, a arte em países menos desenvolvidos é algo complicado para todo mundo, seja deficiente ou não. Então para a pessoa com deficiência ela tem algumas travas. A primeira, que para mim é uma das mais fortes, é o preconceito. A segunda é a falta de acessibilidade atitudinal, pois muito se fala em acessibilidade, mas é muito importante entender que se a sociedade não tiver a atitude de mudar, nada acontece”.
Você achou que estava acabando, né?!
Assista ao vídeo de Ari Prótazio, que fala da porta fechada que virou uma janela aberta.
A Semana Modos de Acessar, ação do Sesc São Paulo, acontece de 3 a 10 de dezembro e promove diversas atividades para incentivar a participação social das pessoas com e sem deficiência. Diante do momento de pandemia, o evento acontece inteiramente no ambiente digital.
A apresentação de Ari é uma das sete que compõem a apresentação proposta pelo Coletivo Home Art.
Acompanhe mais apresentações em www.sescsp.org.br/modosdeacessar
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