Na pandemia, os serviços essenciais de transporte público colocaram os motoristas e cobradores de ônibus em 1º e 2º lugar no ranking dos profissionais que mais morreram de COVID-19. Nesta tragédia social e cotidiana, o espetáculo TrabalhaDORES tem um itinerário que revela as  desigualdades mortais que ceifaram a vida de milhares de brasileiros que foram obrigados a arriscar suas vidas, deslocando-se diariamente no trajeto de ir e vir de casa para o trabalho. O ônibus ficou lotado de trabalhadores que não puderam parar.

“O ônibus nunca parou. A frota seguiu rasgando e dilacerando nosso destino. A roda que roda, girou e levou embora o pulsar alegre do meu coração, cinza, somos todos nós. Tantos nós. Um mar aberto de dor. O transporte é uma máquina de guerra que carrega os soldados do cotidiano. Alguns nem sabem, mas todos sentem a cobrança que diariamente faz as catracas girarem. O suor, o sorriso, o semblante tranquilo, o tempo de vida do meu pai.”
Luiza, filha que perdeu o pai na pandemia.

No dia 24 de Abril de 2024, a Zózima Trupe estreia seu novo espetáculo teatral, TrabalhaDORES, no ônibus urbano cultural do grupo, que ficará estacionado dentro do Sesc Campo Limpo. A pesquisa aborda cenicamente histórias de trabalhadores, especialmente aqueles que mais morreram devido a COVID-19: os motoristas e cobradores de ônibus. O espetáculo segue em temporada com datas nos meses de abril, maio e junho, passando também pelas unidades do Sesc Florêncio de Abreu, Sesc Carmo e Sesc São Caetano.

Sob direção e dramaturgia de Anderson Maurício, o elenco embarca numa viagem rumo às dores, faltas e desejos dos sujeitos em trânsito, trabalhando a partir de manifestos escritos pelo poeta Marcelino Freire, pela arquiteta e pesquisadora Ermínia Maricato e pelo urbanista Nabil Bonduki. Fruto da pesquisa desenvolvida com o aporte da 38° edição da Lei de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, o projeto deu início ao processo de retomada das ações artísticas no Terminal Parque Dom Pedro II, o maior terminal urbano da América Latina, onde o grupo realiza residência desde 2007.

Nesse período pandêmico, diante de uma tragédia que não era apenas de saúde pública, mas social, a Trupe sentiu uma grande necessidade de ouvir o público e criou metodologias de escutas para engendrar as histórias de passageiros e trabalhadores sobre o período da pandemia, e após um processo de 14 (catorze) meses de investigação, surgiu o espetáculo. Era necessário, porém, exercitar e elaborar esse trabalho de forma afetiva, coletiva e artesanal, para que fosse desenvolvido um registro-memória inesquecível. As vivências coletivas deixaram sequelas, marcas e uma série de questionamentos:

O que um grupo de teatro, que pesquisa o ônibus urbano como espaço cênico, poderia fazer diante de uma pandemia, se não perceber que o ônibus nunca parou? O que poderia fazer um coletivo de artistas periféricos, que percebia seus vizinhos e iguais em meio a tanto sofrimento, luto e desigualdade? O que poderia ser feito, se não vivenciar juntos os processos de luto e de esperança? O que podem artistas e trabalhadores da cultura, oferecer àqueles tantos outros trabalhadores da cidade de São Paulo se não dar as mãos e seguir em irmandade? Podemos juntos trabalhar as suas – e nossas – dores?

TrabalhaDORES é um manifesto sonoro-teatral conectado às vivências da Zózima a aos ônibus, terminais, passageiros, trabalhadores e a própria cidade em movimento e às tantas vozes que se somam na construção do pensamento e do fazer artístico da Trupe, que costura em sua encenação canções, textos e projeções criados durante o processo de pesquisa do grupo. A caracterização do elenco é composta por figurinos e maquiagens da poligên das profissões, uma crosta cinza dolorida remetendo à dureza da cidade que devora seus cidadãos, onde todos os personagens representam trabalhadores reais, como também fantasmas dos trabalhadores que já se foram. É um manifesto sonoro e operístico que ressoa as dores do transporte público, resultado do processo de desigualdade social que atinge as periferias: ônibus públicos que circulam como navios negreiros, lotados, carregando a população, vidas eternamente destinadas ao trabalho.

Zózima Trupe I sobre o coletivo

A Zózima Trupe é um grupo de teatro que pesquisa o ônibus urbano como um espaço cênico de descentralização e democratização do acesso às artes. Desde 2007, o grupo tem expandido a ação teatral para diversas regiões de São Paulo com uma proposta investigativa e desafiadora, que se debruça como uma pesquisa contínua e visa promover apresentações teatrais e tantas outras manifestações culturais à população. Desbravar o arcabouço do ônibus como espaço cênico e falar diretamente ao trabalhador, aquele que tem o próprio corpo abatido dia a dia pelas insuficiências do transporte coletivo, são os pontos fundantes dos movimentos de pesquisa teatral da Zózima Trupe desde a sua origem.

Ao longo da trajetória e pesquisa do grupo em torno do ônibus, também foram realizadas diversas ações em outros Estados brasileiros, além de países da América Latina e Europa (Chile, Argentina e Portugal). Reconhecida pela crítica, público e grande mídia, a Trupe foi indicada ao prêmio Shell de Teatro na categoria Inovação pela pesquisa contínua de ampliação do público para o teatro em 2019 e foi contemplada com diversos editais e parcerias para fomentar a realização de seus projetos nos últimos anos.

Enquanto é verdade que outros coletivos, trupes, grupos e companhias teatrais desenvolvem ou já desenvolveram, de forma esporádica, ações cênicas em ônibus pelo Brasil afora, somente a Zózima Trupe, grupo periférico da Zona Leste de São Paulo, tem impactado o setor cultural do país através de um trabalho contínuo das possibilidades de encenações nesta composição tão próxima do público – seja nas linhas regulares do transporte coletivo ou no próprio ônibus do grupo: um veículo que, ao longo dos anos, passou por inúmeras reformas e adaptações com a inclusão de equipamentos sonoros e de iluminação, e foi nomeado como “Omnibus Para Todes”, se tornando o primeiro Centro Cultural Sobre Rodas do Brasil.

TrabalhaDORES I ficha técnica

ESPETÁCULO TEATRAL I DRAMA I 90 MIN I 10 ANOS

com_ Zózima Trupe
encenação e dramaturgia _ Anderson Maurício direção musical _ Rodrigo Régis e Cristiane Mesquita direção de arte _ Letícia RMS
textos _ Marcelino Freire, Ermínia Maricato e Nabil Bonduki canções _ Cleide Amorim, Priscila Reis e Zózima Trupe artistas pesquisadores _ Anderson Maurício, Cleide Amorim, Junior Docini, Priscila Reis e Tatiane Lustoza
cantores convidados _ Cristiane Mesquita e Marcello Mesquita
percussão _ Denis Lisboa
sintetizadores e sonoplastia _ Pero Manzé
vídeo mapping _ Vj Soma e Letícia RMS
conteúdo de vídeo _ Leonardo Souzza e Letícia RMS iluminação _ Junior Docini
cenografia e figurino _ Verônica Elvira Kobus e Letícia RMS
preparação vocal _ Cristiane Mesquita e Marcello Mesquita
preparação corporal _ Felipe Teixeira operadora de luz _ Rafael Inácio operador de som _ Pedro Moura motorista _ Wharley Frazão
designer _ Nando Motta
produção geral _ Tatiane Lustoza
produção _ Brenda Rebeka e Maytê Costa
fotografia _ Leonardo Souzza
adereços cenográfico_Deoclecio Alexandre
maquiagem_Janaina Meireles
parceiros de pesquisa _ Eduardo Pizarro, Paulo Akio, Ma Devi Murti, Silvia Oliveira, Victor Nóvoa, Gabriel Neistein, Leopold Nosek, Maria Rita Kehl, Claudia Barral, Marcela Boni, Nabil Bon- duki, Erminia Marcato, Rodrigo Campos e Marcelino Freire.
Apoio de produção _ Iara Nazario, Samyra Keller e Kauã Ferreira.Apoio na maquiagem_Wallace Stravinskas

SERVIÇO

quando: 24 de Abril  à 03 de Maio de 2024.
dias e horários: Quartas, quintas e sextas às 19h30. (Exceto dia 1 de Maio, feriado, às 18h).
local: Dentro do ônibus estacionado na unidade do Sesc Campo Limpo.
capacidade: 20 lugares.
endereço: Nossa Sra. do Bom Conselho, 120- Vila Prel, São Paulo- SP, 05763-470.
ingressos: Espetáculo gratuito (Retirada dos ingressos 1h antes no local de apresentação).