Para esta edição da revista do Centro de Pesquisa e Formação, tivemos a oportunidade de entrevistar a bailarina Angel Vianna. Em fevereiro deste ano, ela veio para São Paulo a trabalho e ficou hospedada na casa de sua amiga Isaura Botelho. Aproveitamos para bater um papo numa tarde de sexta-feira; éramos: Isaura , Juliano, Rosana e Angel.
Como ela mesma menciona na entrevista, ela tem muitas histórias para contar a respeito da sua trajetória como bailarina, de suas relações com diversos artistas e intelectuais, de seu casamento com o também bailarino e coreógrafo Klauss Vianna, do seu papel na formação de profissionais da dança e de muitos outros assuntos que não seria possível elencar aqui.
Transcrevemos abaixo alguns trechos dessa deliciosa conversa com
uma das maiores artistas brasileiras, que, aos 87 anos, continua trabalhando
intensamente pela dança no Brasil.
Eu acredito no que eu escolhi para fazer e fiz com muito desejo.
Eu comecei lá em Belo Horizonte. Comecei a trabalhar com a área de Artes Plásticas, fui aluna do Guignard durante um bom período, na área de desenho, e tive aula com o Franz Weissman, que dava aula de escultura.
Eu gostava de fazer minhas esculturas, porque eu gosto de manipular,
eu nem sabia que eu gostava e aprendi a gostar. Eu comecei a usar a massa de argila e outros materiais. Uma coisa bonita que eu ouvi dele, foi quando eu disse: professor, me ensina a fazer escultura? Ele respondeu: Angel, eu não vou te ensinar a fazer escultura, eu vou te ensinar a usar o material da escultura, quem faz a escultura é você. Que belo professor, ele tinha o cuidado de ensinar a manipular os materiais. É igual ao meu rabalho, se eu toco num aluno, eu manipulo toda a textura, os ossos, a pele.
Em Belo Horizonte eu fiz música, artes plásticas, dança. A música começou
muito cedo na minha vida. Todas essas artes foram muito importantes para mim, porque todas fazem parte de um trabalho necessário a uma escola de dança. A dança foi a última a entrar na minha vida, começou com o Carlos Leite6, em Belo Horizonte.
Eu sou de família árabe, libanesa, e para o meu pai, a dança para uma moça não era uma coisa boa, mas eu me virava bem com a minha mãe, falava que eu ia à casa de uma amiga, e pronto! Ele não era bravo, mas era decidido. Não, era não, e pronto!
Bom, consegui me formar em todas essas áreas, a escola do Guignard
foi muito importante para mim. Em Belo Horizonte, nos anos 50, tinha chegado uma mulher fantástica chamada “Jane Mild”, era Belga, e foi chamada pela polícia militar para fazer o retrato falado dos bandidos da época. E eu soube que ela fazia escultura, fazia retrato falado e fazia máscara, eu achei que ela iria me ensinar muito bem a fazer as esculturas porque ela fazia a própria pessoa. Estudei com ela, ao mesmo tempo terminei a escola de Belas Artes. Aí veio o Carlos Leite, acabei entrando na escola de ballet junto com Klauss Vianna, que era o meu grande amigo. Junto com a gente estava Décio Otero, Jura Otero, era muita gente.
Eu tenho muita história para contar.
Carlos Leite amava o que fazia, era muito rigoroso, vinha com aquelas
varinhas nas pernas, mas era para fazer a gente crescer. Ele dava aula de ballet. Eu e o Klaus fazíamos ballet. Carlos Leite era do Rio Grande do Sul, mas já estava no teatro municipal de Belo Horizonte há muito dançando.
Dançou também com o ballet russo, fizeram concurso no Rio e entrou
junto com Tatiana Leskova. E eu e o Klauss fomos ver o Ballet da Juventude, com ele e a Tatiana Leskova, e nós ficamos muito encantados.
E o Carlos Leite foi convidado pela UNE para ficar em Minas e nessa época ele fundou a Companhia de Dança de Minas Gerais. Ele foi lá para o edifício do INPS, lá no 9° andar para fazer o estúdio dele, perto do Cine Brasil, na Praça 7, em Belo Horizonte. Ficamos lá um tempão; fundou a Companhia de Minas Gerais, estava eu e o Klauss, Marilene Martins, que depois fundou o Transforma. Que era minha colega de dança e depois foi para a minha escola. Nós viajávamos muito pelo triângulo mineiro para dançar. Nós fugíamos um pouco, tomávamos uma cervejinha, depois morria todo mundo de medo do Carlos Leite.
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