Arte dos sentidos

01/11/2024

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Considerado um dos maiores artistas contemporâneos brasileiros, Carlito Carvalhosa ganha exposições simultâneas no Sesc Pompeia e no Instituto Tomie Ohtake, na capital paulista 

Por Luna D’Alama 

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Um ateliê montado na casa de número 7 de uma vila no bairro de Pinheiros, zona Oeste de São Paulo, nos anos 1980, abrigava jovens artistas que tinham, em comum, propostas estéticas e a amizade. Faziam parte do Grupo Casa 7: Carlito Carvalhosa (1961-2021), Nuno Ramos, Fábio Miguez, Paulo Monteiro e Rodrigo Andrade, que costumavam criar, coletivamente, obras neoexpressionistas com tinta industrial sobre grandes folhas de papel kraft. O imóvel foi demolido, mas a produção desses artistas e o legado de Carvalhosa permanecem. Falecido em 2021, aos 59 anos, o paulistano se formou em arquitetura pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), estudou artes visuais na Alemanha e teve uma vasta produção (sobretudo de pinturas e esculturas), que abrangeu quatro décadas e o uso de materiais diversos.  

“A obra de Carlito Carvalhosa é um dos legados de longa duração para a história da arte, se pensarmos desde o Helenismo, na Antiguidade Clássica. Ele tinha obsessão por fósseis e materiais que mudam com o tempo. Suas instalações de grandes dimensões, por exemplo, não ocupam o espaço, elas são o espaço”, resume o venezuelano Luís Pérez-Oramas, ex-curador do MoMA, doutor em ciências sociais e um dos curadores da exposição A Natureza das Coisas – Carlito Carvalhosa, no Sesc Pompeia [leia mais em A natureza de Carvalhosa].  

Em paralelo à mostra no Sesc Pompeia, é realizada a partir deste mês, pelo Instituto Tomie Ohtake, a exposição A Metade do Dobro, que reúne pinturas, esculturas e instalações de menor porte feitas pelo artista, que gostava de explorar os sentidos e utilizar materiais tão diferentes quanto tinta a óleo, cera, porcelana, tecido, madeira, gesso e vidro, em obras bi e tridimensionais. Segundo Daniel Rangel, diretor do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da Bahia, parceiro de Carvalhosa por três décadas e, também, curador da exposição, o artista gostava de trabalhar opostos e exercitar a dialética entre materiais leves e pesados, transparentes (ou reflexivos) e opacos. “Carlito também fazia muito esse jogo de tirar as coisas de seus lugares e funções de origem e de lhes devolver novos espaços e significados. Queria utilizar matérias-primas que já existissem na natureza”, explica Rangel.   

Como artista formado em arquitetura, Carvalhosa também se inspirava em grandes arquitetos modernistas, como Oscar Niemeyer (1907-2012), Paulo Mendes da Rocha (1928-2021) e Lina Bo Bardi (1914-1992). Assim como Bardi, por exemplo, o paulistano buscava transformar espaços em lugares – ou seja, em espaços ocupados. Agora, as obras de ambos se encontram e dialogam na Área de Convivência do Sesc Pompeia.  

Historiadora da arte, professora da Universidade Anhembi Morumbi e curadora-ajunta da mostra, Lúcia Stumpf é hoje responsável pela curadoria do acervo do artista, com quem começou a trabalhar em 2021, na organização de seu arquivo (papéis, jornais, fotografias etc.). “Carlito deixou um arquivo muito rico de projetos, maquetes, anotações e guias de montagem especificando o que deu certo ou errado, e até o tipo de cola usado nas instalações. É todo um sistema com processos e métodos, no qual também há um diálogo interno do artista com suas obras”, destaca Stumpf. A especialista considera que há um eixo comum que guia todo o trabalho de Carvalhosa, da década de 1980 até 2021. Como o conheceu de trás para a frente, isto é, do fim para o começo, Stumpf tem uma visão privilegiada, quase total, do trabalho dele. “Era uma pessoa que escrevia a partir de fluxos de pensamentos poéticos e caóticos, e esses escritos se materializaram em uma série de produções. Na exposição do Sesc Pompeia, não existe essa de ‘don’t touch, it’s art’ (‘não toque, é arte’ – frase comum em muitos museus), a interatividade é bem-vinda”, acrescenta. E assim, Carvalhosa, que gostava de abordar questões amplas da humanidade, relativas às transformações do espaço-tempo, continua presente.   

A natureza de Carvalhosa 

Retrospectiva A Natureza das Coisas reúne no Sesc Pompeia, pela primeira vez, cinco instalações de grande porte do artista paulistano  

Ao longo de sua trajetória, Carlito Carvalhosa (1961-2021) produziu, além de quadros e esculturas, obras efêmeras como performances e instalações de grandes dimensões, concebidas originalmente como trabalhos in situ (ou site specific). Até fevereiro de 2025, porém, cinco dessas produções “reencarnam” no Sesc Pompeia, na exposição A Natureza das Coisas, e se tornam recipientes do espaço que as contém, acomodando, reinventando e tensionando esse ambiente projetado, nos anos 1970 e 1980, pela arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi. 

Divididos em quatro núcleos (Tecidos, Luz e Som, Gesso, Postes), os trabalhos monumentais de Carvalhosa apresentam tecidos, lâmpadas, copos de vidro, postes e um molde gigante de gesso usado na obra Já Estava Assim Quando Eu Cheguei, feita inicialmente, em 2006, para o MAM-RJ e refeita, em 2019, para a inauguração do Sesc Guarulhos. Já os postes de madeira (utilizados antigamente na iluminação pública) estão presentes em Sala de Espera (MAC/USP e Kukje Gallery, Seul, 2013) e Linha de Sombra (MuBE, 2017). Os tecidos de TNT branco aparecem em Faço Tudo para Não Fazer Nada (Galeria Nara Roesler, 2017), enquanto lâmpadas, taças e copos transparentes, de diferentes modelos e tamanhos, compõem Imaterialidade (Sesc Belenzinho, 2015). Todas as obras foram remontadas conforme o projeto original, replicando as criações de Carvalhosa.   

Esta é a primeira vez que várias obras instalativas do artista contemporâneo são reunidas num único lugar, ao mesmo tempo. Algo que, segundo a curadora-adjunta Lúcia Stumpf, só poderia ocorrer pela amplitude da Área de Convivência do Sesc Pompeia e pela visão retrospectiva que agora se tem da vida e da obra do paulistano. Além do impacto visual, com paisagens deslocadas, copos colados na vertical e postes que parecem flutuar, os trabalhos expostos convidam o público a se tornar sujeito do ato criativo, oferecendo a oportunidade de interação e fruição corpórea. Além disso, a mostra reúne parte do arquivo documental de Carvalhosa.  

Segundo a gerente da unidade, Monica Carnieto, a partir de materialidades diversas, Carlito Carvalhosa promove uma intensa articulação com o espaço e a experiência de fruição do Sesc Pompeia.  

POMPEIA 

A Natureza das Coisas – Carlito Carvalhosa 

Curadoria de Daniel Rangel e Luís Pérez-Oramas, com curadoria adjunta de Lúcia Stumpf. 

Até 9 de fevereiro de 2025. Terça a sábado, das 10h às 21h30; domingos e feriados, das 10h às 18h. GRÁTIS.  

Mais informações em sescsp.org.br/pompeia 

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