Ed. 86 – Entrevista: Leci Brandão

23/01/2024

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“A passagem do tempo na minha vida, ela é simplesmente fantástica, porque quanto mais esse tempo passa, mais coisas maravilhosas acontecem na minha caminhada”

Leci Brandão nasceu no Rio de Janeiro, em 12 de setembro de 1944. É cantora, compositora e umas das mais importantes intérpretes de samba da música popular brasileira. Começou sua carreira musical no início da década de 1970, tornando-se a primeira mulher a participar da ala de compositores da Estação Primeira de Mangueira, no Rio de Janeiro. Ao longo de sua carreira, gravou 25 álbuns.

Segunda deputada negra da história da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), Leci também atua com a questão das populações indígenas e quilombolas, da juventude – em especial pobre e negra – das mulheres e do segmento LGBT. Com a última reeleição, Leci se tornou a primeira mulher negra a cumprir quatro mandatos consecutivos na história da Alesp.

A artista trata de temas importantes desde o início de sua carreira, na década de 1970, quando eram considerados tabu. Atualmente, esses mesmos temas são pautas reconhecidas, como a questão LGBT e o racismo estrutural.

Leci é um exemplo de resistência. Como compositora, sofreu por ter suas letras consideradas políticas demais. Primeira cantora famosa do país a se pronunciar como lésbica, também escreveu e cantou letras que retratam o tema. Músicas como As pessoas e eles, do LP Questão de Gosto, de 1976, na qual a cantora descreve um fato real, quando presenciou uma pessoa sendo hostilizada por ser gay. Ou a música Ombro amigo, do LP Coisas do meu Pessoal, de 1977, trilha da novela Espelho Mágico, na qual conta a história de um amigo que dizia só poder ser ele mesmo quando estava numa boate.

Para conseguir entrar na ala de compositores da Mangueira teve de escrever uma carta de intenções e um samba de quadra.

Em 1980, sua gravadora rejeitou a canção Zé do Caroço por ser muito política e trazer um profundo olhar crítico sobre o país por meio da história de um líder comunitário de Vila Isabel. Depois disso ficou cinco anos sem gravar.

Em 1985, lançou o álbum Isso É Fundo de Quintal, que trazia a música proibida e lhe devolveu a fama. Essa canção emblemática, que

trata do país de ontem e hoje, virou um hino nas rodas de samba. Já foi gravada por Art Popular, Revelação, Mariana Aydar e Seu Jorge. Em 2012, foi homenageada pelo enredo da Acadêmicos do Tatuapé, em São Paulo. Mãe, sobrinhas e irmã estavam presentes. A escola ficou em segundo lugar e subiu com o enredo.

Leci atribui aos orixás seu sucesso. Para ela é um reconhecimento espiritual. Conta que nun- ca deixa de lado a sua fé e seus orixás “Ogum e Iansã, dois guerreiros, estão norteando o meu caminho. Passei pela umbanda, mas quando co- nheci Caboclo Rei das Ervas, casa de candomblé em São Gonçalo, foi que as coisas realmente se abriram para mim”, revela.

Prestes a completar 80 anos em 2024, ela conta na entrevista como enxerga o próprio envelhecimento e qual é a visão das religiões de matriz africana sobre o tema.

Mais 60 A senhora se lembra das pessoas mais velhas da sua família?
Leci Brandão A minha avó por parte de mãe, essa avó eu conheci, e as pessoas que conhecíamos por parte de vizinhos meus, pessoas ligadas a batiza- dos de primos, sobrinhos, sempre pessoas mais idosas estavam presentes nesses momentos e eu consigo lembrar bem dessas pessoas.

Mais 60 Como o samba entrou em sua vida? Leci Brandão O samba está na minha vida des- de que eu estava para nascer, porque minha mãe saía na Mangueira, e eu nem sonhava em nas- cer. Minha avó desfilou na Mangueira e minha madrinha de batismo morava no Morro da Man- gueira. A Mangueira na minha casa sempre foi uma coisa muito natural.

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