Foto: João Caldas.
Você sabe quem foi Antônio Abujamra? Você se recorda de seus principais trabalhos como diretor, ator e apresentador?
Para responder estas e tantas outras questões, a partir do dia 28 de novembro, o Sesc Ipiranga recebe a exposição Rigor e Caos – Antônio Abujamra, que percorre a trajetória profissional do diretor, ator e apresentador de televisão Antônio Abujamra. A exposição traz extenso material audiovisual, com cerca de 220 fotos, vídeos e projeções dispostas em cinco salas, nas quais o espectador pode imergir na obra do premiado artista paulista.
Com curadoria da diretora, produtora e roteirista Márcia Abujamra, a mostra é pautada por diferentes núcleos: linha do tempo; com cerca de 220 fotos de mais de 80 espetáculos teatrais; uma sala com um vídeo de cenas da atuação de Abujamra em cinema e televisão, e outra com cenas de programas de televisão dirigidos por ele; um ambiente dedicado ao Provocações, com vídeos de alguns dos melhores momentos do programa e um espaço que traz projeções de cenas de espetáculos de teatro em que o múltiplo artista atuou e/ou dirigiu.
No galpão de entrada, o público pode se debruçar sobre uma linha do tempo, que expõe a obra do diretor ao longo de um período de 60 anos, de 1955 a 2015. Em múltiplos painéis, são expostas imagens de programas de peças emblemáticas dirigidas por ele, como Roda Cor de Roda, O Rei Devasso, Hamleto, O Inspetor Geral, Exorbitâncias e O Casamento. Há, ainda, textos em painéis escritos pelo diretor Antunes Filho, o crítico de teatro Alberto Guzik, a pesquisadora e teórica Maria Tereza Vargas, a atriz e diretora Paula Sandroni e Hugo Barreto, secretário geral da Fundação Roberto Marinho.
A exposição oferece especial imersão no teatro de Abujamra, arte à qual dedicou mais de 50 anos de sua vida, com mais de 120 peças dirigidas, tendo o arquivo pessoal de Abujamra como sua principal fonte.
A vida é sua, estrague-a como quiser
A frase da dramaturga inglesa Shelagh Delaney é uma dentre muitas que o diretor incorporou ao seu vocabulário. Algumas delas, como “Sem crueldade não há humor”, de sua autoria, estão dispostas no piso e em painéis luminosos no espaço expositivo. Outra frase que reflete muito sua personalidade, era “Viajar, não importa para onde”. No final dos anos 1950, Abu, como era chamado, passou dois anos na Europa. Em Barcelona, conheceu João Cabral de Melo Neto, poeta que teve papel decisivo em suas escolhas como diretor. Fez estágio com os diretores franceses Jean Vilar e Roger Planchon, e no Berliner Ensemble, para se aprofundar na obra de Bertolt Brecht.
Provocações
Duas salas da exposição trazem instalações imersivas para que o público usufrua alguns dos melhores momentos de Provocações, um dos programas de maior sucesso da TV Cultura, que estreou em 2000. A mostra exibe trechos de entrevistas com artistas, políticos, filósofos, cientistas, historiadores, além de cenas do quadro Vozes da Rua. Abujamra sempre encerrava o programa declamando poesias, textos e perguntava aos convidados: “O que é a vida?”. Alguns dos nomes de personalidades que podem ser assistidos nos vídeos são Clodovil, Maureen Bisilliat, Aziz Ab’Saber, Rita Cadillac e Tatiana Belinky.
Cenografia
Para traduzir o universo múltiplo e aparentemente contraditório de Abujamra, o cenógrafo André Cortez criou o espaço que associa o rigor da geometria ao caos. Imagens fragmentadas, multitelas que permitem a projeção simultânea de diferentes cenas, além uma sala “caixa-preta” para os vídeos de teatro.
Biografia
Antônio Abujamra nasceu em Ourinhos, interior de São Paulo, em 1932. Foi um dos primeiros a introduzir os princípios e métodos teatrais de Bertolt Brecht, Roger Planchon e outros mestres da contemporaneidade em palcos brasileiros. Participa da revolução cênica efetivada nos anos 1960 e 1970, caracterizando seu trabalho pela ousadia, inventividade e espírito provocativo.
Formado em filosofia e jornalismo pela PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), em Porto Alegre, no ano de 1957. Inicia-se como crítico teatral e, paralelamente, faz suas primeiras incursões como ator e diretor no Teatro Universitário, entre 1955 e 1958. Em 1963, associa-se a Antônio Ghigonetto e Emilio Di Biasi e funda o Grupo Decisão, com a intenção de disseminar o teatro político com base na técnica brechtiana. Em 1964, o grupo monta O Inoportuno, de Harold Pinter, seu primeiro sucesso, e transfere-se para o Rio de Janeiro, onde a peça chama a atenção, abrindo portas para seus realizadores.
Já no Rio, Abujamra dirige O Berço do Herói, de Dias Gomes, em 1965, espetáculo interditado pela censura no dia do ensaio geral. Nos anos seguintes, dedica-se ao Teatro Livre, empresa de Nicette Bruno e Paulo Goulart, realizando montagens ambiciosas como As Criadas, de Jean Genet, em 1968. Nos anos 1980, Abujamra se engaja no projeto de recuperar artisticamente o TBC – Teatro Brasileiro de Comédia. Inaugura novas salas cria um movimento que faz surgir novos autores e diretores. Entre os espetáculos mais importantes no TBC estão Morte Acidental de um Anarquista, de Dario Fo, em 1982; A Serpente, de Nelson Rodrigues, em 1984; e um de seus maiores sucessos Um Orgasmo Adulto Escapa do Zoológico, de Dario Fo, em 1984, que traz um solo virtuosístico que projeta a atriz Denise Stoklos para uma carreira internacional, tendo sido aplaudido em diversos festivais no Brasil e no mundo.
Aos 55 anos, inicia sua carreira de ator. Em dois anos, atua em duas telenovelas e três peças e é premiado por sua atuação no monólogo O Contrabaixo, de Patrick Suskind, em 1987. Em 1989, ganha o troféu APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte), como melhor ator de TV, pelo icônico papel Ravengar, na novela Que Rei Sou Eu?. Em 1991, recebe o Prêmio Molière pela direção de Um Certo Hamlet, espetáculo de estreia da companhia Os Fodidos Privilegiados, fundada por Abujamra para ocupar o Teatro Dulcina, no Rio de Janeiro.
À frente de Os Fodidos Privilegiados, Abujamra dirige regularmente espetáculos na década de 1990, dividindo mais tarde essa tarefa com João Fonseca. Com o grupo, ganha o Prêmio Shell de melhor direção de 1998, numa adaptação do romance O Casamento, de Nelson Rodrigues. Abujamra trabalha também, ativamente, como diretor e ator de televisão, em novelas, especiais, programas educativos e teleteatros, e em 2000 inicia o Provocações, programa de entrevistas na TV Cultura.
Antônio Abujamra prezava o talento e o preparo técnico de seus atores e atrizes e nunca deixou de exigir precisão em suas criações. Ao mesmo tempo, instaurava um caos criativo que permitia que o ator se colocasse individual e pessoalmente nos espetáculos. Rigor e Caos, dois traços que incorporaram seus trabalhos e traduziram sua essência.
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