Por Auritha Tabajara | Ilustrações Lucélia Borges
Leia a edição de agosto/23 da Revista E na íntegra
Fiz um poema quentinho,
Publiquei logo cedinho,
Saudosa do Ceará.
Um jeitinho diferente
De falar pra toda gente
O melhor que vem de lá.
O valor do meu Nordeste,
Água clara azul celeste,
Onde eu podia brincar.
Na aldeia, a criançada
Pode ficar na calçada,
Uma forma de educar.
Meu Nordeste tem riqueza;
Além de tanta beleza,
A poesia improvisada.
Meu Ceará tem cultura,
Tem tradição, tem bravura,
Tem dança pra garotada.
Tem toré pra festejar
Na aldeia com maracá
Pra nos trazer alegria.
Um povo muito animado
Com tabajara do lado
Tristeza lá não se cria.
Tem festa do que plantou,
Rito que se conservou,
Carne de sol com pirão.
Rapadura com farinha,
Baião de dois com galinha
E as frutas da região.
Saudade dentro do peito
É algo que não tem jeito,
Mas não priva de aprender.
Serei sempre nordestina,
Onde eu for, a vida ensina,
Só cresce mais o saber.
Nosso Deus da criação
Nos criou com inspiração,
Sem guerra sem preconceito.
O homem quer ser esperto,
Acha que em tudo está certo,
Destrói o que é mais perfeito.
Ô grande espírito sadio,
Desperte sabedoria,
Para que, com autoria,
Possa versar e aprender,
E uma luz acender
No seio da humanidade,
Com muita simplicidade,
Sem ego no coração,
Somente a inspiração,
Com espiritualidade.
O Universo tem vida,
Tem vida no Universo.
Quando com ele converso,
Sinto me fortalecida
Com a mãe agradecida,
Floresce a diversidade,
Nos traga felicidade,
Em todos os movimentos.
Sejamos conhecimentos
Com espiritualidade.
A arte que foi criada,
Chamado planeta Terra,
Com alto, baixos e serra,
Entregue nas nossas mãos,
Da criança aos anciãos,
É pra continuidade;
Desmatar e fazer cidade,
Furando e queimando a terra,
Por dinheiro vira guerra,
Sem espiritualidade.
Quem ama a mãe natureza
Não joga lixo no chão,
Vive com a gratidão,
Respeita tudo ao redor,
E da criança ao maior,
Sabe fazer caridade,
Escuta a ancestralidade,
E espalha onde estiver,
Não define homem, mulher
A espiritualidade.
Somos povos diferentes,
Diferentes rituais,
Que respeitam os ancestrais,
Pra luta fortalecer
E frutos poder nascer
Em meio à diversidade,
Ser cultura e liberdade
Da raiz até a semente
E ser visto como gente
Nossa espiritualidade.
Pai Tupã nos fortaleça
No caminho e na missão,
Nos dê sempre inspiração
Nos momentos de cantar,
Com ervas poder curar
Com amor, simplicidade,
Para que a humanidade,
Saiba contar sua história,
Herança seja a memória
Da espiritualidade.
Sou Auritha Tabajara,
Nascida longe da praia,
Fascinada pelas rimas
E melodia da jandaia.
No Ceará foi a festa,
Meu leito foi a floresta
Nas folhas de samambaia.
A minha essência ancestral
Me encontra cordelizando,
Faz me existir resistindo,
Ao mundo eu vou contando;
Que minha forma de amar
Ninguém vai colonizar,
Da arte sempre vou me armando.
Filha da mãe Natureza,
Mulher guerreira eu sou,
Com a força feminina
Cinco séculos galgou.
Cada vez mais sábia e forte,
Meu medo é somente a morte
Que o preconceito gerou.
Hoje essa mulher levanta
Com letra e voz autoral
Contra toda violência
Por um amor ancestral
De um corpo ensanguentado,
Usado sem ser amado,
Com espírito imortal.
E baseado na Bíblia,
O homem veio ditar,
Sua fé diz que é pecado
O mesmo gênero amar,
E com massacre e doença,
Nossa língua, nossa crença,
Vem tentando assassinar.
Essa força feminina
Traz um sagrado poder,
Nascemos com a natureza,
Com ela vamos morrer,
A nossa ancestralidade,
E a nossa diversidade,
Nos fazem sobreviver.
Minha avó é referência,
Desde o tempo de menina,
Até me tornar mulher,
Das histórias que ela ensina,
Me ensinou a falar
Que a mulher tem seu lugar
É raiz que não termina.
Eu não sou como Iracema
A de José de Alencar,
Sou do povo TABAJARA
Onde canta o sabiá
Minha aldeia tem imburana
Minha terra é soberana
Pelo toque do maracá.
Auritha Tabajara é escritora, poeta, contadora de histórias e a primeira cordelista indígena do Brasil. Sua primeira obra, Magistério indígena em verso e prosa (2007), foi adotada como leitura obrigatória pela Secretaria de Educação do Ceará. Também é autora de Toda luta e história do povo Tabajara (2008), Coração na aldeia, pés no mundo (2018), A grandeza Tabajara (2019) e A lenda de Jurerê (2020), entre outras obras.
Lucélia Borges é xilogravadora, contadora de histórias, terapeuta holística e pesquisadora da cultura popular brasileira. Mestre em estudos culturais pela USP, ilustrou vários folhetos de cordel e livros, como A Jornada Heroica de Maria (2019) e Contos Encantados do Brasil (2022), de Marco Haurélio, ambos premiados com o selo Cátedra Unesco (PUC-Rio).
A EDIÇÃO DE AGOSTO/23 DA REVISTA E ESTÁ NO AR!
Para ler a versão digital da Revista E e ficar por dentro de outros conteúdos exclusivos, acesse a nossa página no Portal do Sesc ou baixe grátis o app Sesc SP no seu celular! (download disponível para aparelhos Android ou IOS).
Siga a Revista E nas redes sociais:
Instagram / Facebook / Youtube
LEIA AQUI a edição de AGOSTO/23 na íntegra. Se preferir, baixe o PDF para levar a Revista E contigo para onde você quiser!
Utilizamos cookies essenciais para personalizar e aprimorar sua experiência neste site. Ao continuar navegando você concorda com estas condições, detalhadas na nossa Política de Cookies de acordo com a nossa Política de Privacidade.