MULHERES QUE COMUNICAM | Cresce a presença feminina no mundo do futebol

01/07/2023

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No jornalismo impresso, no rádio, na TV ou na internet, cresce a presença feminina para noticiar, apresentar, comentar e analisar o futebol

Por Luciane de Castro

Nos últimos anos, tem-se debatido de modo intensivo a presença feminina no mundo do futebol. De fato, se as quatro décadas de vigência do Decreto-Lei 3.199/1941 – que proibiu, até 1979, a prática de alguns esportes por mulheres, entre os quais o futebol – protelou a presença delas, essa realidade vem mudando nas últimas décadas. O crescimento é notado, fundamentalmente, em campo, pelo interesse cada vez maior de jogadoras no futebol profissional. A exemplo do que assistiremos a partir do dia 20 deste mês, na Copa do Mundo Feminina de Futebol, sediada na Nova Zelândia e na Austrália, e que contará com a participação da seleção brasileira.

No entanto, para além da presença dessas esportistas em competições, entra em campo um time feminino dedicado à comunicação dos eventos, em funções como a de repórter, apresentadora, comentarista e analista de futebol. São profissionais que atuam em mídias diversas, como o jornal impresso, a televisão, o rádio e a internet, noticiando tudo o que ocorre durante a disputa. A participação das mulheres na cobertura esportiva cresce na mesma proporção do aumento de interesse pelo futebol feminino, que tem conquistado, a cada dia, mais espectadores e torcedores.

Conhecimento como diferencial

Para Luciana Mariano, pioneira na narração de futebol em TV aberta, o encontro com esse esporte demorou a acontecer, já que não era um tema presente na vida em família. “Nós não falávamos de futebol em casa. Então, não houve nenhuma espécie de incentivo à prática”, lembra. Foi seu interesse pela área de comunicação que a aproximou do universo esportivo. A narradora conta que, aos 16 anos de idade, recebeu o convite para fazer um teste na Rádio Difusora de Jundiaí, no interior de São Paulo. “Comecei exercendo a profissão, depois me especializei. Iniciei fazendo resumo de horóscopo e de novela. Poucos meses depois, uma pessoa da equipe de esportes se ausentou e fui convidada para cobri-la. Por conhecer um pouco mais de futebol do que a média das mulheres, fiquei na equipe esportiva da rádio”, relata.

Ao contrário de Luciana, a jornalista Denise Thomaz Bastos vivenciou em família, desde a infância, a paixão pelo esporte. “O amor pelo futebol se deu por influência da minha mãe, minha avó e minha tia. A prática começou na rua e foi o futebol e o esporte que me fizeram encontrar meu lugar em um grupo”, afirma a jornalista, que foi escalada pela Globo, emissora onde trabalha, para integrar a equipe de TV que fará a cobertura da Copa do Mundo neste mês. “Com meu pai, acompanhava alguns jogos de várzea. Torcer em estádios virou uma paixão com uns 12 anos de idade. Minha tia Celina, já falecida, foi quem me fez ter amor pelos campos de futebol. Quando entrei na Globo e conheci alguns jornalistas, pensei: ‘Quero fazer isso. Vai me deixar perto do futebol’”.

Olho no lance

Se reportar, noticiar ou apresentar o resultado dos jogos de uma Copa do Mundo já é tarefa das grandes, o que dizer da função de comentarista, historicamente associada à figura masculina? Esse é o desafio que Ana Thaís Matos assumiu em sua carreira profissional, tornando-se a primeira mulher a comentar um jogo do Brasil em Copa do Mundo em TV aberta. Sua voz e rosto ficaram conhecidos pelos telespectadores em 2022, na Copa do Mundo Masculina de Futebol, realizada no Catar.

A comentarista teve certeza de que seguiria carreira no jornalismo esportivo ainda durante a graduação, quando também integrou o time de futsal da faculdade: “As amigas do time que já atuavam na área me convenceram. Ainda rolava dúvida sobre qual área seguir, se política, cultura ou esporte”. O interesse e a experiência no futsal acabaram sendo o diferencial que a levaram de vez ao ofício. “Joguei futsal por 15 anos e, se não estava jogando, estava torcendo e, mais tarde, trabalhando. Ou seja, sou a soma da pequena torcedora, da jovem atleta e da eterna apaixonada por futebol”, resume.


Rompendo estigmas

Ainda que a participação de mulheres nas funções de comunicação no mundo esportivo esteja em pleno crescimento, persiste a resistência de parte do público, por julgar que elas não detêm o domínio sobre o tema. Segundo Giovana Capucim e Silva, mestra em história social pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora do assunto, o julgamento do futebol como espaço masculino foi construído há décadas, mas, aos poucos, vem sendo rompido. “Essa concepção se transforma, e mesmo que as mulheres sofram mais críticas do que os homens, elas se mantêm nesses espaços. Suas presenças são fundamentais e instigam a presença de mais mulheres daqui para o futuro”, defende a autora do livro Mulheres Impedidas – A proibição do futebol feminino na imprensa de São Paulo (Multifoco, 2017).

A pesquisadora avalia que houve uma mudança importante nesse cenário, especialmente a partir de 2015. “De lá para cá, temos um movimento de mulheres que já estavam narrando e comentando, por exemplo, saindo dos espaços alternativos e ocupando a grande mídia. Isso as coloca mais visíveis ao grande público que consome futebol no país. E é importante porque, mesmo aos poucos, estamos conseguindo romper com essa ideia de que o futebol é um espaço de reserva masculina”, reforça.

A chegada e consolidação da internet também foram fatores que permitiram a ampliação da presença feminina no futebol, movimento que posteriormente foi refletido nas mídias tradicionais, chegando à televisão. “As redes sociais foram as responsáveis por essa mobilização, através dos movimentos feministas. A rede permitiu e deu voz às mulheres e meninas que sempre amaram o futebol e nunca tiveram espaço nos meios tradicionais de comunicação. Além disso, acredito que passamos a nos indagar o porquê de não acompanharmos o mundial feminino como acompanhamos o mundial masculino”, analisa a narradora de futebol Luciana Mariano.

A comentarista Ana Thaís Matos associa esse aumento da participação das mulheres a um contexto de mobilização mundial por ampliação de direitos no campo da discussão de gênero e no combate a preconceitos. Para ela, essa mudança traz novas perspectivas para o universo antes tão masculinizado do esporte. “Queremos contar a história a partir do nosso ponto de vista, da nossa vivência, experiência, diálogos e vocabulário. Como eu sempre digo, quem sabe o que é melhor para as mulheres são as mulheres. Então, nosso engajamento tem sido, e sempre foi, fundamental para sedimentar nossas conquistas”, aponta.

Já a jornalista Denise Thomaz enxerga benefícios para além das quatro linhas do campo, expandindo a conquista das mulheres em outras frentes. “Reivindicar direitos e deixar claro que mulheres são capazes de qualquer coisa é fundamental. O crescimento de interesse pela modalidade passa também por sua divulgação”, finaliza.

Temos um movimento de mulheres que já estavam narrando e comentando, por exemplo, saindo dos espaços alternativos e ocupando a grande mídia. (…) É importante porque, mesmo aos poucos, estamos conseguindo romper com essa ideia de que o futebol é um espaço de reserva masculina

Giovana Capucim e Silva, pesquisadora e escritora

em campo!

No mês da Copa, o Sesc São Paulo oferece atividades que celebram a presença feminina no futebol, como cursos, bate-papos e exibições de jogos

No mês em que jogadoras de diferentes países se reúnem para disputar a Copa do Mundo Feminina de Futebol, na Nova Zelândia e na Austrália, unidades do Sesc São Paulo realizam diversas atividades que celebram a presença das mulheres nesse esporte. São bate-papos, cursos e oficinas que refletem sobre a presença das mulheres no futebol, seja no campo, na condição de jogadoras, ou em outras funções relacionadas à modalidade. Além disso, algumas unidades oferecem, também, a exibição dos jogos da competição mundial.

“A Copa do Mundo Feminina de Futebol é uma oportunidade ímpar para promover e valorizar a presença das mulheres nos lugares ocupados predominantemente pelos homens, para além dos campos”, afirma Carolina Seixas, gerente da Gerência de Desenvolvimento Físico-Esportivo do Sesc São Paulo. “A partir dessa verdadeira ‘vitrine esportiva’, é possível suscitar discussões, trazer exemplos de conquistas e de caminhos a serem percorridos e conscientizar sobre as diferenças. Ao longo do período dos jogos, preparamos uma programação diversa e inclusiva. Vale lembrar que o Sesc oferece o espaço e as condições para o desenvolvimento do esporte para todas as pessoas”, complementa.

Confira alguns destaques da programação:

PINHEIROS

Esporte diverso – O futebol feminino no Brasil

Bate-papo virtual sobre o atual momento do futebol feminino e perspectivas para o futuro. Com a ex-jogadora Sisleide Lima do Amor, a “Sissi”, a empreendedora social Sidinéia Chagas e a jogadora Miraildes Maciel Mota, a “Formiga”.

Dia 18/7, terça, das 20h às 21h30. GRÁTIS. 

MOGI DAS CRUZES

Donas da bola: bate-papo sobre histórias e conquistas do futebol feminino

Conversa sobre obstáculos, percalços, desafios e lutas da modalidade. Com a ex-atleta da seleção brasileira Solange Bastos e a árbitra da FIFA Tatiana Sacilotti.

Dia 19/7, quarta, das 19h às 21h. GRÁTIS.

VILA MARIANA

Comunicadoras do esporte: comunicação, narração e entrevista

Curso ensina técnicas de comunicação para o desenvolvimento de habilidades de narração esportiva. Com condução dos jornalistas Milla Garcia e Anderson Cheni.

De 19/7 a 17/8, quartas e quintas, das 18h às 21h. GRÁTIS.

SOCORABA

Narração e comentários esportivos

Curso teórico e prático com dicas sobre preparo do jogo, análise e formação tática dos times, propondo reflexões sobre a ocupação das mulheres no jornalismo esportivo.

De 27/7 a 10/8, quintas, das 19h30 às 21h30. GRÁTIS.

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