Programa Mente Ativa do Sesc Santa Catarina confirma evidências sobre a importância da Estimulação Cognitiva para o envelhecimento ativo e autônomo

05/07/2024

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André Junqueira Xavier
Médico geriatra, doutor em ciências da saúde e informática, fundador e coordenador do Serviço Ambulatorial de Memória (Memo) da Faculdade de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina e assessor do Programa Mente Ativa do Sesc-SC.

Cristiani Jacobus Vieira
Analista de Programação Social do Sesc-SC, responsável pela coordenação estadual do Trabalho Social com Pessoas Idosas do Sesc-SC. cristiani.7161@sesc-sc.com.br

Resumo

Acumulam-se evidências sobre a efetividade de metodologias de estimulação cognitiva na prevenção e melhoria de vários aspectos da memória, diminuição de sintomas depressivos e manutenção da capacidade funcional. Em função disso, aqui estão apresentados os resultados do programa de estimulação e reabilitação cognitiva Mente Ativa, realizado no ano de 2023 em 27 unidades do Sesc Santa Catarina. Metodologia: Análise longitudinal univariada, bivariada e multivariada, do tipo antes e depois da primeira turma do Programa Mente Ativa (PMA), uma coorte aberta de participantes com 40 anos ou mais de ambos os sexos, com tempo de acompanhamento entre seis e dez meses. Foram coletados, mediante consentimento informado, dados sobre memória, capacidade funcional, sintomas depressivos, fatores de risco e proteção e um questionário aprofundado sobre motivações, preferências e expectativas dos participantes. Resultados: 27 equipes do Sesc Santa Catarina, 501 participantes, 89% de mulheres com idade média de 70,4 anos e escolaridade média de 11,2 anos. Conclusão: Houve uma significativa melhoria do estado cognitivo ao final do primeiro ciclo do programa, acompanhada de significativa diminuição de sintomas depressivos com manutenção da capacidade funcional e velocidade da marcha. A melhoria cognitiva foi proporcional à melhora nos sintomas depressivos e ambas se relacionaram a um maior número de sessões frequentadas. As melhorias cognitivas e nos sintomas depressivos ocorreram em toda a turma, independentemente do estado cognitivo inicial. Os sintomas depressivos melhoraram entre aqueles que relataram ter depressão e também entre aqueles que não relataram depressão.

palavras-chave: estimulação cognitiva; reabilitação cognitiva; humanização; grupos; prevenção; sintomas depressivos.

Introdução

As Demências, uma Mudança de Paradigma

Os vários problemas de memória que afetam a população adulta de todo o mundo são e continuarão sendo uma enorme preocupação para todos. As demências e, especificamente, a doença de Alzheimer, trazem um cenário de aumento progressivo dos casos que chegarão a cerca de 50 milhões de pessoas no mundo, com piora inexorável e poucas perspectivas de cura (THIES e BLEILER, 2011).

Por outro lado, evidências se acumulam indicando que a cada geração que chega aos 60 anos de idade ocorre a diminuição significativa da incidência das demências, ou seja, há menos demência para o mesmo grupo etário (SCHRIJVERS et al. 2012; MATTHEWS et al. 2016; ROCCA et al. 2011). Esse processo foi detectado inicialmente em países e regiões mais envelhecidos e com níveis educacionais e de saúde pública progressivamente melhores e vem se mantendo desde então. Análises na população de Santa Catarina também detectaram essa mudança (d’ORSI E. et al., 2010; DANIELEWICZ et al., 2016). Desta forma, a alta prevalência de problemas de memória encontrados nesses locais provavelmente se deve ao melhor tratamento/cuidado e à maior estabilização dos quadros de perda de memória, fazendo com que essas pessoas vivam mais do que a incidência de novos casos, que vêm decrescendo (A. J. XAVIER et al., 2014; PRINCE et al., 2012). Estes achados abrem novos horizontes de prevenção e promoção da saúde cognitiva da nossa população adulta e idosa.

De alguma forma o próprio progresso da nossa sociedade, com me- lhoria do padrão socioeconômico, está se demonstrando uma poderosa ferramenta de prevenção das demências (SCHELTENS et al., 2016; FLE- TCHER, 2023) e reforça a importância de programas de estimulação e reabilitação cognitiva para a otimização deste fenômeno.

Estes fatos ganham especial importância diante do esgotamento das teorias atuais sobre as causas das principais demências e os sucessivos fracassos terapêuticos (BERMEJO-PAREJA e DEL SER, 2024). Isso abre caminho para novas teorias e tratamentos (RICHARD, DEN BROK e VAN GOOL, 2021). Para as pessoas que vivem na comunidade, os processos que podem levar a problemas de memória são na verdade múltiplos e indistinguíveis (SCHNEIDER et al., 2007).

Se avolumam evidências em favor de medidas preventivas e reabilitadoras, dentre elas a Estimulação Cognitiva (EC) (SPECTOR et al., 2003; SARAGIH et al., 2022; LOK, BULDUKOGLU e BARCIN, 2020; AGUIRRE et al., 2010). Atualmente, sabe-se que a estimulação e reabilitação cognitiva é útil para pessoas com demência leve ou moderada para torná-las mais capazes de lidar com suas atividades. As evidências sugerem que a EC é uma valiosa ferramenta para atender pessoas com demência a superar barreiras no seu cotidiano (BAHAR-FUCHS et al., 2019). Muitas metodologias de estimulação cognitivas são efetivas, especificamente se atuam nos eixos de atividade cognitiva, atividade física e atividade social. Isso também ocorre com a metodologia da Oficina da Lembrança, desenvolvida no Brasil e utilizada há cerca de 20 anos na Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) (QUIALHEIRO et al., 2022; KRUG et al., 2017; XAVIER et al., 2010; KRUG et al., 2015; XAVIER et al., 2010; VALSECHI et al., 2023) e que funciona como base metodológica para o Programa Mente Ativa (PMA) do Sesc Santa Catarina.

Possivelmente estamos chegando a um novo equilíbrio entre estes paradigmas que, sem se anularem, poderão agir de forma sinérgica, caracterizando-se em uma cognição suficiente para sustentar um curso de vida humanizado e legítimo.

Desde o começo do século XXI, estudos mostraram a possibilidade de prevenção da demência culminando em dois artigos da Lancet Commission (Livingston et al. 2017; 2020), que divulgaram evidências sobre fatores modificáveis com potencial de prevenção em cerca de 40% dos casos: tratar o diabetes, a depressão, parar de fumar, controlar o peso, estudar, ser fisicamente ativo, consumir pouco álcool, controlar a hipertensão, evitar o isolamento social, respirar ar não poluído, evitar traumatismo craniano e evitar e minorar perdas auditivas. Logo, a demência atualmente é uma síndrome fortemente prevenível. O termo Síndrome Demencial (SD) é mais cabível do que declínio cognitivo e demências, salvo raras exceções, já que são multifatoriais.

Especificamente, esta metodologia de fatores de risco modificáveis foi pesquisada no Brasil, verificando-se que o potencial de prevenção de SD no Brasil é maior do que em países mais ricos (48,2%), sem diferença entre brancos e negros, e que as regiões mais pobres do Brasil possuem um potencial de prevenção ainda maior (54%) e, ainda, de acordo com esse estudo, os fatores mais importantes foram escolaridade, hipertensão arterial e perda auditiva (SUEMOTO et al., 2023). Esse cenário mais favorável provavelmente se deve a uma população um pouco mais jovem e passível de intervenções mais precoces.

As atividades realizadas estimulam o desenvolvimento cognitivo, tendo como base interação social, vivências, jogos, dinâmicas, exercícios e ferramentas na internet, sendo sempre mediadas pelo processo grupal.

Desta forma, a perda cognitiva se mostra modificável, especifica- mente a incidência de síndromes demenciais, que vem diminuindo em locais onde há melhor acesso à educação, à saúde e à proteção social.

Sobre o Programa Mente Ativa (PMA) do Sesc Santa Catarina

Em março de 2023, o Sesc Santa Catarina implantou o Programa de Estimulação Cognitiva – Mente Ativa (PMA) em 27 unidades no estado. Uma atividade que faz parte do portfólio dos serviços da área de Trabalho Social com Pessoas Idosas/Programa Assistência. Essa proposta é uma evolução do projeto anterior realizado há quase dez anos pelo Sesc Santa Catarina, o Grupo da Memória. E surgiu da necessidade de aprimoramento e alinhamento metodológico, atualização e qualificação dos serviços prestados ao público 60+.

O PMA é um programa de intervenção multimodal para estimulação cognitiva, manutenção e recuperação da independência, autonomia e melhoria da performance funcional e cognitiva. Tem como objetivo a promoção do envelhecimento ativo e saudável dos participantes, realizado por meio de atividades semanais em grupos nas unidades do Sesc Santa Catarina, com duração anual (10-11 meses). O programa tem a humanização e o convívio social como fenômenos centrais para o pleno funcionamento da cognição.

O PMA é voltado para pessoas a partir dos 60 anos com queixas, dificuldades cognitivas ou intenção de ganho de capacidade cognitiva, que apresentam fatores de risco para déficit de memória e/ou com déficits cognitivos iniciais ou que querem focar na prevenção. Também há possibilidade de atendimento de pessoas a partir dos 40 anos que já apresentam dificuldades cognitivas.

O PMA conta com uma metodologia própria, baseado em evidências e na Oficina da Lembrança (Unisul) para melhorar o desempenho da atenção, da memória, do humor, do raciocínio, da concentração e das atividades básicas de vida diária. Desta forma, previne futuros declínios cognitivos, contribuindo para um envelhecimento ativo e saudável, com mais autonomia, consciência e independência.

As atividades realizadas estimulam o desenvolvimento cognitivo, tendo como base interação social, vivências, jogos, dinâmicas, exercícios e ferramentas na internet, sendo sempre mediadas pelo processo grupal. As intervenções visam proporcionar mais autonomia funcional, mais independência e mais qualidade de vida aos participantes.

O acompanhamento é uma característica básica do programa: os participantes são avaliados com testes validados e um questionário multidimensional detalhado sobre saúde, autopercepção de memória e motivação para analisar o desempenho individual. A partir dos resultados, é possível direcionar as atividades de acordo com o perfil e a necessidades de cada grupo. Ao final do ano, cada participante recebe uma devolutiva individual das equipes do Sesc Santa Catarina, apresentando os dados do seu desempenho no programa. Cada grupo também recebe uma devolutiva geral sobre o desempenho do coletivo.

A construção dessa proposta começou em 2022, com o processo de criação metodológica, construção de materiais técnicos e início dos treinamentos virtuais das equipes do Sesc Santa Catarina. Todo o processo de trabalho contou com a assessoria técnica do dr. André Junqueira Xavier, médico geriatra, doutor em informática em saúde e pós-doutorado em estimulação cognitiva, que atua nas áreas de ensino médico, epidemiologia do envelhecimento e reabilitação da memória. Ele é coordenador do Ambulatório da Memória e da Oficina da Lembrança da Unisul Grande Florianópolis, além de ser criador e coordenador da disciplina de telemedicina do curso de medicina da Unisul.

Durante o ano de 2023, realizamos o treinamento presencial da nova metodologia para as equipes que atuam com programa no estado, com um total de 41 colaboradores envolvidos. E para o suporte técnico, estudo de casos e supervisão da implementação do programa ocorreram reuniões mensais virtuais durante todo ano, conduzidas pelo dr. André e pela analista responsável pelo programa no estado.

RESULTADOS POSITIVOS NO PRIMEIRO ANO DE REALIZAÇÃO Metodologia

Foi realizada a análise univariada, bivariada e multivariada. A bivariada utilizou o qui-quadrado, o teste T de student para amostras independentes e para analisar a evolução dos escores foi usado o teste T para amostras pareadas. Para comparação de medidas contínuas a regressão linear, e para análise multivariada com regressão logística para medidas discretas foi admitido como padrão o P valor menor ou igual a 0,005. Algumas análises foram de coorte e outras levaram em conta a característica longitudinal e prospectiva de uma coorte aberta. Foram estudadas as características sociodemográficas, de motivação, problemas e qualidades cognitivas, comorbidades/fatores de risco, avaliação cognitiva, de sintomas depressivos, capacidade funcional e marcha simples e com dupla tarefa. Foram utilizados os seguintes instrumentos validados no Brasil: MoCA Teste, BOMFAQ/OARS, GDS-15 e Timed up and Go (TUG) dupla tarefa.

Resultados

Foram estudadas 501 pessoas com tempo de participação entre 5 e 11 meses, com as duas coletas de testes completos. Idade média de 70,4 anos; escolaridade média de 11,2 anos; sendo que 45% possuem alguma ocupação não vinculada a emprego formal; 84% são aposentadas; 33% vivem sozinhas; há 1,83 pessoas em média em cada residência; e 31% estão vivenciando situações de luto ou perda significativa.

Em relação aos motivos apontados para participar do programa, 82% querem melhorar a memória, 74% prevenir problemas de memória/saúde, 63% ficar/permanecer atualizadas, 50% querem ficar junto aos amigos e 41% aumentar sua vida social.

Em termos de dificuldades de memória no dia a dia, 68% possuem esquecimento/desatenção em situações de memória operacional de curto prazo como, por exemplo, “ir do quarto para a sala e esquecer o que iria fazer lá”; 57% esquecem onde colocaram objetos; e 36% se esquecem de recados.

Em termos de comorbidades relatadas e fatores de risco reconhecidos para problemas de memória, se destacam: ansiedade (51%); hipertensão arterial (46%); covid (41%); deficiência visual (49%); deficiência auditiva (26%); medicações para dormir (27%); desequilíbrio (24%); dor crônica (21%); e diabetes (20%). Em termos de preferências em relação a atividades de lazer e estimulação, 75% gostam de caminhada, 59% de dança, 60% de leitura e filmes e 46% de jogos.

Perfil das primeiras turmas a partir da coleta de dados dos instrumentos de avaliação funcional, cognitiva, de dupla tarefa e de sintomas depressivos

População de 501 pessoas, em média com 4,9 sintomas depressivos pelo GDS (ponto de corte de 5 pontos), capacidade funcional de 13,3 (relativamente independentes), MoCA teste de 22,2 (normal baixo para a escolaridade). Em relação aos testes de marcha Timed Up and go Dual Task (TUG); TUG simples foi de 9,87±2,7 segundos, o TUG cognitivo foi de 12,0±4,3 segundos e o TUG motor foi de 12,0±4,2 segundos. A maior escolaridade foi associada à maior pontuação no MoCA Teste, p=0,046.

Não foram encontradas diferenças significativas entre as categorias sexo, etnia/cor e aposentadoria em termos dos benefícios proporcio- nados pelo PMA. População com boa capacidade funcional, sintomas depressivos proeminentes e capacidade cognitiva na faixa normal/ baixa podem melhorar.

Houve ganho cognitivo independentemente do estado cognitivo inicial e esse ganho ocorreu de forma semelhante em todas as equipes regionais. Homens chegam mais velhos, mais comprometidos cognitiva

mente e funcionalmente, mais lentificados e com mais comorbidades, e ainda se encontram sub-representado nesta amostra. As pessoas diabéticas tiveram maior comprometimento funcional. Os hipertensos são mais velhos, mais comprometidos cognitivamente e funcionalmente, mais lentificados e com mais comorbidades. Os deprimidos são significativamente mais comprometidos cognitivamente e funcionalmente, mais lentificados e com mais comorbidades. A ansiedade é a maior queixa autorreferida e fica mais presente quanto mais jovens são os participantes.

Análise das mudanças cognitivas ocorridas entre o início e o fim do primeiro ano de atividades das primeiras turmas do PMA

A variação percentual do MoCA Teste, como está representada no gráfico abaixo, mostra que houve ganho significativo de capacidade cognitiva em todos os grupos, independentemente da pontuação inicial.

Gráfico 1: Percentual de melhoria cognitiva medida pelo MoCA Teste ao final do programa, independentemente da intensidade das dificuldades cognitivas iniciais Sesc-SC, 2021-1 (n=501)

No gráfico abaixo se encontram as mudanças de categoria de acordo com critérios de alteração clinicamente significativa no MoCA Teste (perda ou ganho cognitivo de 4 pontos ou mais pelo MoCA Teste) e os critérios de suspeita de Demência e Comprometimento Cognitivo Leve pelos pontos de corte de Brucki et al. (CESAR et al., 2019).

Gráfico 2: Mudanças na proporção de participantes em cada grupo pelo estado cognitivo por pontos de corte do MoCA Teste

Observações:
• Critério para Síndrome Demencial (SD) inicial: MoCA Teste de 14 pontos ou menos.
• Critério para saída da SD: MoCA Teste de 15 ou mais pontos na segunda coleta e ganho de pelo menos 4 pontos em relação à primeira coleta.

  • Critério para entrada em SD: MoCA Teste de 14 pontos ou menos na segunda coleta e perda de pelo menos 4 pontos em relação à primeira coleta.
  • O conceito de SD não é igual ao diagnóstico de demência e sim uma suspeita a partir de um instrumento de rastreio.

    Desta forma, no início do PMA, 45 participantes preenchiam o critério para SD, provavelmente leve/moderada, pois os mais graves têm mais dificuldades de estar na comunidade de forma mais independente, destes, 18/45 (40%) saíram do critério de SD. Por outro lado, dentre aqueles que não apresentavam critérios para nenhum tipo de déficit cognitivo apenas 3/235 (1,2%) entraram na categoria de SD, também houve uma entrada de 4/221 (1,8%) em SD daqueles que preenchiam um critério de Comprometimento Cognitivo Leve (que não compro- mete de forma significativa as funções do dia a dia). Esta mudança foi estatisticamente significativa com P valor de 0,000 (análise bivariada por meio do qui quadrado de Pearson). Verificou-se que a mudança para melhor continuou significativa de forma independente p=0,000 na análise multivariada por meio de regressão logística, sendo que a escolaridade mais alta foi também foi positiva de forma independente p=0,019.

Observação:
• Critério para CCL: MoCA Teste de 15 até 23 pontos.
• Critério para saída da CCL: MoCA Teste de 24 ou mais pontos na segunda coleta.
• Critério para entrada em CCL: MoCA Teste de 15 até 23 pontos na segunda coleta.
• O conceito de CCL utilizado representa uma suspeita a partir de um instrumento de rastreio e não é diagnóstico.

Após análise por meio de regressão logística, ajustada para idade, sexo, escolaridade, cor autodeclarada e estado cognitivo no início do PMA, verificou-se que a mudança para melhor continuou significativa de forma independente p=0,000, sendo que a escolaridade mais alta foi protetora p=0,032 e ser mulher p=0,008 foi fator de risco signifi- cativo de forma independente para piora.

Após o final do ciclo de atividades do PMA houve forte diminuição do número de pessoas que se enquadravam inicialmente nas categorias SD e CCL e também um aumento significativo daqueles que se enquadraram inicialmente como sem déficit cognitivo (saudáveis). Isso ocorreu independentemente da idade, escolaridade, sexo, cor, fatores de risco, morbidades e queixas de memória. Análise por meio de modelo bivariado e multivariado com regressão logística (p=0.000).

Análise das mudanças nos sintomas depressivos ocorridas entre o início e o final do primeiro ano de atividades das primeiras turmas do PMA

Gráfico 4: Relação inversa significativa entre a diminuição
dos sintomas depressivos medidos pelo GDS-15 e o número de sessões realizadas pelos participantes, p=0,020. (32), mostrando a importância da participação assídua no programa

Gráfico 5: Alta prevalência de sintomas depressivos na população das primeiras turmas do PMA e mudanças ao fim do ciclo de atividades, classificação por pontos de corte do GDS-15

Mudança percentual nas categorias de depressão (GDS-15) antes e depois do Mente Ativa, primeira turma – Sesc-SC (n=501)

Este gráfico mostra uma importante mudança nos critérios de depressão pela diminuição dos sintomas depressivos antes e depois da participação no programa, e esse efeito ocorreu também entre aqueles que não relataram ter depressão.

Gráfico 6: Relação direta entre a melhoria cognitiva e a melhoria concomitante nos sintomas depressivos

Associação significativa entre a melhora da memória e a diminuição dos sintomas para aqueles com autorrelato de depressão.

Houve associação entre a melhoria dos sintomas depressivos e a melhoria da cognição, especialmente entre aqueles que já tinham um diagnóstico prévio (autorrelatado) de depressão. A depressão é uma das principais causas reversíveis de problemas de memória. Análise por meio de modelo bivariado com regressão linear (P=0,037).

Conclusões

Pelo que a equipe tem notícia, este é o primeiro programa de estimulação cognitiva implementado com a abrangência de todo um estado no Brasil. É pioneira também a metodologia de construção de questionário apropriado, criação de um Manual Técnico do Programa Mente Ativa com orientações e procedimentos, formação continuada das equipes, acompanhamento, discussão e supervisão dos casos, presença de um serviço de telemedicina (cooperação técnica com a Unisul) prestando apoio ao programa, análise epidemiológica e devolutiva estruturada para todos os participantes.

É importante frisar que os vários talentos e capacidades técnicas em função do background de cada técnico responsável pelo PMA nas unidades (enfermagem, serviço social, educação física, educação, pe- dagogia, música, arte, dança, informática, filosofia, administração e psicologia, entre outros). Também ocorre a junção pioneira de aspectos qualitativos e quantitativos na avaliação, acompanhamento e devolu- tivas aos participantes, em termos de evolução individual e em grupo.

A escolaridade, a idade, o sexo, a cor/etnia e a aposentadoria não representaram obstáculos para as melhorias percebidas com o programa, mostrando seu caráter inclusivo. Ao contrário, a maior escolaridade foi um importante fator protetor contra perdas cognitivas, conforme já encontrado em outros trabalhos científicos. O autorrelato de ansie- dade foi o fator de risco mais prevalente nesta população, mas não se relacionou à perda de memória.

Em relação a problemas de saúde prévios, se destacou a covid, que atingiu 41% da população da primeira turma, sendo que 8% desenvolveram covid longa, que se caracteriza por sintomas de longa duração, tais como fadiga, dores e problemas de memória.

Houve marcante melhoria da pontuação (e percentagem) no escore cognitivo MoCA Teste após a intervenção. Essa melhora foi independente de outros fatores, tais como idade, escolaridade, gênero, comorbidades, fatores de risco, capacidade cognitiva, funcional, velocidade da marcha e sintomas depressivos.

Possivelmente essa melhoria se associou à melhora de sintomas depressivos medidos pelo GDS-15, (ANDRÉ XAVIER et al., 2011) especialmente entre aqueles com autorrelato de depressão. O maior número de presenças se associou aos bons efeitos encontrados (efeito dose – resposta). Os escores relativos à marcha e dupla tarefa (TUG) ficaram estáveis, o que leva à possibilidade de se intensificar atividades físicas no futuro. A capacidade funcional sofreu leve melhoria, pois já se encontrava em patamar relativamente alto.

Ocorreram vários encaminhamentos de casos mais complexos que foram atendidos pela rede local em parceria com o atendimento de te- lemedicina do curso de medicina da Unisul. Ocorreu uma excelente aceitação do programa, marcada pelo baixo perfil de desistências, de apenas 12%, sendo que a maior fração se deveu a problemas de saúde apresentados pelos participantes e suas respectivas famílias.

Houve associação da melhoria cognitiva e de sintomas depressivos com a maior participação no programa. As pessoas com 75 anos ou mais a idade não sofreram impedimento de melhorias, confirmando o efeito benéfico também em população mais velha.

O Programa Mente Ativa obteve resultados em concordância com as evidências encontradas na literatura científica atual.

Limitações

Perdas de informação acima de 20% em algumas variáveis impedi- ram análises mais aprofundadas.

Diagnósticos autorrelatados são menos precisos. A alta escolaridade encontrada dificulta a generalização dos resultados para outras populações. Apesar do treinamento e capacitação prévios com as equipes, podem ter ocorrido variações no padrão de aplicação dos testes em função da abrangência da atuação e pessoas envolvidas. Possivelmente algumas pessoas mais frágeis e comprometidas desistiram.

Este é um relatório técnico que não pretende apresentar evidências científicas nem relações de causa e efeito, apenas mostrar que os resultados encontrados concordam com as evidências científicas já estabelecidas para este tipo de trabalho de estimulação cognitiva.

Os critérios utilizados para as categorias de cognição e de depressão foram obtidos por meio de escores padronizados no Brasil e não pelo exame clínico, que é o padrão-ouro.

referências

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