Por Grácia Fragalá
Resumo
Quais são os impactos da vida em sociedade na qualidade da vida de indivíduos no trabalho? Como os profissionais e as empresas podem influenciar a sociedade para favorecer uma relação mais harmoniosa na direção de uma vida mais saudável? O Guia dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU, para as Empresas, afirma que “os negócios não podem ter sucesso em sociedades que fracassam.” Num mercado competitivo, no qual produtos e serviços são cada vez mais parecidos, a sociedade valoriza de modo crescente empresas que atuem efetivamente para gerar valor para todos, trabalhadores, acionistas e sociedade. É o tema ESG ganhando cada vez mais espaço nas agendas das organizações.
As constantes transformações no mundo do trabalho ensejaram o surgimento de um novo perfil dos profissionais que ainda conseguem se manter empregados nas organizações empresariais. São profissionais que almejam desenvolver-se pessoal e profissionalmente em ambientes de trabalho que valorizem seu potencial e que favoreçam o exercício de uma atividade com significado, onde possam colocar em prática seu propósito de vida.
As novas teorias de gestão de pessoas defendem uma “empresa humana, integrada, multidimensional, concebida como um lugar de desenvolvimento de iniciativas individuais e coletivas” (GORZ, 2003, p.70). Nesta direção, constata-se grande empenho dos profissionais de Recursos Humanos e das áreas de Segurança no Trabalho, Saúde e Bem-Estar em proporcionar um ambiente de trabalho que permita, a esses profissionais, atender aos seus anseios de construir suas carreiras mantendo o equilíbrio entre vida pessoal e vida profissional.
Multiplicam-se programas destinados à qualidade de vida e ao bem-estar nas organizações e, embora ainda haja dificuldades em sensibilizar lideranças mais céticas a respeito do acerto desta estratégia, os profissionais da área encontram nos princípios ESG um forte aliado na defesa de seus argumentos.
ESG, sigla em inglês para se referir a boas práticas ambientais, sociais e de governança, foi utilizada em 2004 no documento Who Cares Wins quando o Pacto Global da ONU e o Banco Mundial provocaram as 50 principais instituições financeiras do mundo, a promover a integração dos fatores sociais, ambientais e de governança no mercado de capitais.
Por esta perspectiva, somos estimulados a ampliar o olhar sobre os fatores que impactam a qualidade de vida das pessoas nas organizações, entendendo que as empresas estão inseridas na sociedade e o “S” da sigla, o social, refere-se a um contexto mais amplo que as dependências da unidade produtiva.
O conceito de saúde, adotado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1948, afirma que “Saúde é o estado do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de enfermidade” e este conceito reflete a ideia de que a “saúde deveria expressar o direito a uma vida plena, sem privações”. (SCLIAR, 2007, P.37)
O que significa pensar em uma vida plena, sem privações, do ponto de vista dos princípios ESG?
O desafio, a mim proposto, foi dar foco aos impactos da vida em sociedade na qualidade da vida de indivíduos no trabalho e como os profissionais e as empresas podem influenciar a sociedade para favorecer uma relação mais harmoniosa na direção de uma vida mais saudável.
Sabemos que as empresas têm grande poder de influência e transformação, são formadoras de pessoas e mentalidades de modo que há uma grande expectativa de que o setor produtivo atue de forma decisiva na solução de problemas complexos.
O Guia dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para as Empresas traz uma afirmação instigante: “os negócios não podem ter sucesso em sociedades que fracassam” (GRI, Pacto Global, WBCSD, 2015, p.6), afirmando a importância de se aprofundar a reflexão sobre o papel dos profissionais e das organizações nas transformações sociais necessárias para que o sucesso das empresas não aconteça em “sociedades que fracassam”.
Para contribuir com essa reflexão, recorro à Agenda 2030 da ONU – Organização das Nações Unidas e aos ODS.
Em 2015, a ONU propôs aos seus países membros uma nova agenda de desenvolvimento sustentável para os próximos 15 anos, a Agenda 2030, composta pelos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Esta agenda é um esforço conjunto de países, empresas, instituições e sociedade civil para assegurar os direitos humanos, acabar com a pobreza, lutar contra a desigualdade e a injustiça, alcançar a igualdade de gênero, agir contra as mudanças climáticas, bem como enfrentar outros grandes desafios de nossos tempos, por meio dos 17 Objetivos definidos, os ODS.
“O setor privado tem um papel essencial nesse processo como grande detentor do poder econômico, propulsor de inovações e tecnologias influenciador e engajador dos mais diversos públicos – governos, fornecedores, colaboradores e consumidores.” (Pacto Global, Rede Brasil – https://www.pactoglobal.org.br/ods) No Brasil, a iniciativa é liderada pela Rede Brasil do Pacto Global e conta com a colaboração de apoiadores e parceiros institucionais, que contribuem para que as iniciativas sejam conduzidas no país. São cerca de 1.900 empresas e organizações que apoiam o Pacto Global com recursos financeiros e com serviços pro bono.
Se pensamos a qualidade de vida do ponto de vista dos princípios ESG e dos ODS, entendendo que, como já afirmamos, o ambiente de trabalho não é um sistema fechado e isolado e que, portanto, o que ocorre na sociedade impacta o bem-estar e a qualidade de vida das pessoas nas organizações, certamente nossa abordagem precisará ser ampliada.
Ao pensar nos aspectos ambientais passaremos a considerar o impacto das alterações climáticas sobre a saúde e bem-estar das populações. É provável que os impactos sejam maiores nas áreas tropicais ou frequentemente expostas a fenômenos meteorológicos extremos e altas temperaturas. As recentes chuvas que assolaram o litoral norte de São Paulo são um exemplo desta condição.
Em relação os aspectos sociais – o “S”, haverá que se incluir questões como idade e gênero nas preocupações. O envelhecimento populacional traz novos desafios como a necessidade de que os sistemas de saúde evoluam para permitir acesso e o atendimento às necessidades específicas da população idosa.
Outro desafio são as novas modalidades de trabalho e emprego e suas consequências: novos regimes de horário de trabalho, trabalho remoto – “anywhere office”, regimes flexíveis que rompem as fronteiras entre o trabalho, o lazer e outras atividades; a economia informal, com trabalhadores sem rendimentos regulares e pouca ou nenhuma proteção social, econômica ou legal e os reflexos para a sociedade em geral, como o aprofundamento das desigualdades.
Este olhar amplia a importância dos modelos de governança – que preveem a participação ativa dos governos, empregadores e trabalhadores, como elemento fundamental para a garantia de uma sociedade voltada para prosperar a longo prazo e conseguir atingir seu pleno potencial.
Vê-se, portanto, que há enorme oportunidade para atuar valorizando-se o momento em que o tema ESG ganha espaço nas agendas dos principais executivos das organizações. Num mercado competitivo, no qual produtos e serviços são cada vez mais parecidos, a sociedade valoriza de modo crescente empresas que atuem efetivamente para gerar valor para todos, trabalhadores, acionistas e sociedade.
Grácia Fragalá
Formada em Serviço Social e com MBA em Gestão de Pessoas e Negócios pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Executiva com mais de 20 anos de experiência como responsável pelo planejamento, gestão, controle e execução das atividades de Saúde Corporativa, Segurança no Trabalho, Ocupacional, Programas de Saúde e Bem-estar, Diversidade, Equidade & Inclusão e Responsabilidade Social. Especialista em SDG/ESG Strategy. Coautora nas publicações: “Saúde Mental e Trabalho”, CREMESP, 2015; “FAP-RAT-NTEP: Efeitos na Gestão Empresarial”, FIESP, 2015; “Roteiro Prático para Contestação do FAP – Fator Acidentário de Prevenção 2014”, FIESP, 2014; “Inclusão Social e Profissional – Valorização da Capacidade de Pessoas com Deficiência no Mercado de Trabalho”, FIESP, 2013 e “Sem Barreiras (Inclusão Profissional de Pessoas com Deficiência)”, SMPED, 2008. Sócia na TPA Saúde. Vice-Presidente dos Conselhos Superiores Feminino e de Responsabilidade Social da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Membro do Conselho Orientador da Rede Brasil do Pacto Global – CORB. Conselheira na WILL – Women in Lidership in Latin America. Conselheira na ABQV – Associação Brasileira de Qualidade de Vida. Brasil Coutry Chair – G100, Trade Wing. Mentora de carreira no programa EBWL – Empower Black Women To Senior Leadership, da WILL, Women in Leadership in Latin America e no Programa “Elas na Indústria”, da FIESP. Docente no MBA Gestão Estratégica da Promoção da Saúde e Bem-Estar, no Centro Universitário São Camilo.
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