Textos clássicos ganham releituras e são ponto de partida para espetáculos do MIRADA 

03/09/2024

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“Granada”: espetáculo chileno baseado no mito grego de Perséfone revela as violências do patriarcado que perduram por milênios. Foto: Javiera Miller 

Compor uma programação que seja representativa da produção ibero-americana contemporânea nas artes cênicas: essa é uma das premissas do MIRADA – Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas, que chega à sua 7ª edição de 5 a 15 de setembro no Sesc Santos e Baixada Santista. Como não existe presente sem passado, vamos ver quais textos clássicos estão presentes na programação do MIRADA. 

Em “Granada”, do Chile, o espetáculo parte do mito grego de Perséfone – a filha de Zeus sequestrada virgem pelo tio, Hades, que se torna rainha do mundo dos mortos contra a própria vontade – e chega aos dias contemporâneos para revelar as violências do patriarcado que se perpetuam por mais de 2 mil anos. 

Do mesmo campo de inspiração veio a “Poperópera Transatlântica”, espetáculo do Grupo Mexa que partiu da leitura da “Odisseia”, de Homero, para tecer uma história coletiva entremeada pelas costuras das jornadas individuais de integrantes do elenco. O grupo, que se define como um coletivo “formado por uma equipe interdisciplinar: artista, ativista, cabeleireira, atriz, cineasta, comunicadoras, jornalista, fotógrafa e as sem profissão, LGBT, QIA, cadeirantes, negros (…)”, atuou com a dramaturgia e direção de João Turchi. 

As tramas de três viagens se entrecruzam no tecido de “Poperópera Transatlântica”: a jornada clássica da “Odisseia”, jornadas pessoais e a promessa de uma turnê da companhia. Foto: Navid Fayaz 

Em março de 2020, o Mexa se preparava para entrar em cena na Mostra Internacional de Teatro de São Paulo quando o decreto da pandemia interrompeu o festival. Sem saber o que fazer, a companhia levou a peça para a rua. Amy Letman, diretora criativa do Transform, festival vanguardista de artes performáticas realizado no Reino Unido assistiu ao espetáculo e prometeu que levaria o grupo para a Europa quando tudo aquilo acabasse. “Foi aí que nasceu a Odisseia do Mexa”, relembra João Turchi. 

Corta para os dias – que viraram meses, que viraram anos – de pandemia. Trabalhando remotamente, João propôs ao grupo a leitura da Odisseia e o início dos trabalhos em um novo espetáculo. “Algumas pessoas do coletivo conheciam o livro, outras nunca tinham ouvido falar, mas todo mundo sabia o significado de ‘odisseia’”, conta o diretor e dramaturgo do espetáculo. 

A partir desse contato com o texto clássico, o grupo engendrou três tramas de viagem: a promessa de uma turnê pela Europa, a jornada do livro e suas odisseias individuais. Misturando autoficção e teatro documental, todas estas rotas convergiram na “Poperópera Transatlântica” – o transatlântico do título não é à toa, já que o espetáculo estreou, de fato, do outro lado do Atlântico. Mais precisamente em Berlim, em maio de 2023. 

Para João, a releitura de um clássico sempre se conecta com a vida corrente. “A mitologia grega funcionou como uma ‘desculpa’ para falarmos da nossa própria mitologia”, brinca. “A peça em si tem um método odisseico, já que ela sempre se atualiza com a história da jornada do grupo”, completa. 

“Mendoza”, espetáculo mexicano da companhia Los Colochos, transforma “Macbeth” de Shakespeare . Foto: Zaba Zantcher 

Para além da mitologia grega, autores cânones do teatro se fazem presentes nesta 7ª edição MIRADA. “Mendoza”, espetáculo mexicano da companhia Los Colochos, aposta em uma dramaturgia inventiva e cenografia minimalista, com os atores em cena o tempo todo, para reler “Macbeth”, de William Shakespeare. 

Do Brasil, “Cabaré Coragem”, encenado pelo Grupo Galpão, se apropria de muitas obras de Bertolt Brecht e da personagem principal de uma de suas peças mais famosas, “Mãe Coragem e Seus Filhos”, para criar uma reafirmação da arte como lugar de identidade e permanência por meio do universo do cabaré. 

Criação do “Cabaré Coragem” do Grupo Galpão se deu com fragmentos de muitas obras de Bertolt Brecht, criador também da personagem que inspira o nome do espetáculo. Foto: Edivalma Santana 

Por fim, “Esperando Godot”, montagem do Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona, acrescenta ao texto de Samuel Beckett elementos inesperados – como o Menino Mensageiro transformado em Zé Pelintra e o final surpreendente, capaz de desconcertar o público conhecedor da peça. 

Para Marcelo Drummond, ator em cena na montagem, estes elementos só podiam sair da cabeça de Zé Celso Martinez Corrêa, que escreveu o texto e estreou o espetáculo pouco antes do seu aniversário de 85 anos, em 2022, no Sesc Pompeia. 

“As peças do Zé sempre te convidavam a querer conhecer um pouco mais. Elas são capazes de instigar o público, o que funciona como um convite para conhecer novos universos”, diz Marcelo, viúvo do diretor e dramaturgo que nos deixou em 2023. Provavelmente é o caso deste “Esperando Godot”, que pode fazer muita gente ler ou reler Beckett e, assim, completar o ciclo dos clássicos revisitados: do passado ao presente, resgate e transformação do passado. 

A montagem de “Esperando Godot” pelo Oficina evoca elementos inesperados na adaptação do texto de Samuel Beckett. Foto: Jennifer Glass 

Serviço: 

Granada (CHI) – Direção: Paula Aros Gho
Local: Outeiro de Santa Catarina – R. Visconde de Rio Branco, 48. Santos 
7/9 (sábado), às 14h e às 16h,  8/9 (domingo), às 14h e às 16h. 
Duração: 60 min
Ingressos à venda pelo app Credencial Sesc SP, pelo site e nas bilheterias das unidades. 

Poperópera Transatlântica (BRA) – Grupo Mexa
Local: Ginásio Sesc Santos 
12/9 (quinta), às 19h, e 13/9 (sexta), às 19h. 
Acessibilidade em LIBRAS no dia 13/9. 
Duração: 100 min 
Ingressos à venda pelo app Credencial Sesc SP, pelo site e nas bilheterias das unidades.

Mendoza (MEX) – Los Colochos Teatro 
Local: Teatro Rosinha Machado – Av. Senador Pinheiro Machado, 48. Santos 
9/9 (segunda), às 17h, e 10/9 (terça), às 17h.
Duração: 135 min
Ingressos à venda pelo app Credencial Sesc SP, pelo site e nas bilheterias das unidades.

Cabaré Coragem (BRA) – Grupo Galpão
Local: Arcos do Valongo – Rua Comendador Neto, 03/ Rua do Comércio, 108 ao 132. Santos
8/9 (domingo), às 20h, 9/9 (segunda), às 20h e 10/9 (terça), às 20h.
Duração: 110 min  
Ingressos à venda pelo app Credencial Sesc SP, pelo site e nas bilheterias das unidades. 

Esperando Godot (BRA) – Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona
Local: Arcos do Valongo – Rua Comendador Neto, 03/ Rua do Comércio, 108 ao 132. Santos
13/9 (sexta), às 19h, 14/9 (sábado), às 19h.
Duração: 210 min (com intervalo de 15′)
Ingressos à venda pelo app Credencial Sesc SP, pelo site e nas bilheterias das unidades. 

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