Ator em cena de “Tierra”: espetáculo na programação do MIRADA parte da perda da mãe para entrelaçar narrativas. Foto: Nairí Aharonián
Há pouco mais de dois anos a professora Liliana Auyestarán morria em uma unidade de terapia intensiva em Montevidéu, no Uruguai. Esse foi o ponto de partida para mais um trabalho de seu filho, o dramaturgo e diretor franco-uruguaio Sergio Blanco, conhecido por suas criações no campo da autoficção.
Sergio tem 19 produções encenadas nos últimos dois anos, e “Tierra” se tornou uma delas. Na trama do espetáculo, o autor reúne três personagens que já foram alunos de Liliana, figuras marcadas pela perda de um familiar.
Blanco recria o cenário escolar, com uma quadra esportiva e a escrivaninha da mãe, para entrevistar os personagens. A peça fala não só da forma como a existência se modifica após a morte de um ente querido, mas também da representação cênica.
Apesar do espetáculo partir de uma vivência muito pessoal, Sergio não se sente lidando novamente com o trauma da perda a cada encenação. “Uma vez concluído o trabalho, me sinto muito distante da história. Ela entra no campo da ficção e vejo-a com uma perspectiva mais técnica”, conta o dramaturgo. “Essa ligação mais íntima acontece no momento da escrita, que é um momento de solidão. Aí sim, estou sozinho na minha mesa, oito horas por dia, ali me conecto com um mundo interior muito grande. É quase um trabalho de feitiçaria”.
É a quarta vez que o diretor e dramaturgo vem ao MIRADA. Ele conta que, na noite anterior à entrevista, estava lendo o catálogo da edição e sentindo-se honrado em mais uma vez fazer parte da programação. “É um festival que, para além dos tempos, dos anos, dos rumos, das crises, continua atento ao mundo”, define.
Estar atento ao mundo, para Sergio, é uma das vocações do teatro, especialmente nos dias correntes, em que a institucionalidade democrática e direitos de minorias sociais duramente conquistados são atacados diariamente em muitos países. “O teatro é o contrapeso do fascismo. Sempre foi, desde suas origens”, diz.
Sergio crê firmemente no poder da palavra como instrumento de cura. Autor de um artigo que discorre sobre a relação entre as palavras “trama” e “trauma”, ele acredita que contar histórias é uma forma seminal de encontrar soluções para problemas e angústias – sejam eles individuais ou comunitários.
“Ver a jornada de outra pessoa e como a outra pessoa se curou ajuda muito quem está passando pelo mesmo processo”, defende. “O teatro é isso: mostrar, fabricar possibilidades, idealizar uma comunidade. É saudável ver outra pessoa se curar”.
Não por acaso, sua mãe Liliana, cuja perda foi a ignição para a criação de “Tierra”, era uma reconhecida professora de Literatura em seu país.
Serviço:
Tierra (URU) – direção: Sergio Blanco
Teatro do Sesc Santos
14/9 (sábado), às 21h.
Duração: 100 minutos
Ingressos à venda pelo app Credencial Sesc SP, pelo site e nas bilheterias das unidades.
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