Pra cego ver: Imagem quadrada colorida. Uma charge ilustrada digitalmente. No topo da imagem há o título “Uma tarde em um espaço público”. Uma jovem negra, deitada sobre a grama de barriga para cima e pernas para o ar, ao lado de um jovem branco sentado, com o celular na mão, escorado na sua mochila. De olhos fechados e sorrindo, a jovem diz “Sinto a sustentável leveza do ser”. O jovem sorri. Ao fundo, árvores, um lago com um pato, um bicicleta e o céu azul. Fim da descrição. Crédito: Caco Galhardo.
As delegações brasileiras, nas duas últimas grandes conferências internacionais pelo clima, as COPs (Conferência das Partes) de Glasgow, em 2021, na Escócia, e Sharm El-Sheikh, em 2022, no Egito, promovidas pelas Nações Unidas, foram marcadas pela presença de animadas delegações da sociedade civil brasileira. A COP de Glasgow foi aberta por Txai Suruí, jovem liderança indígena da etnia Paiter-Suruí e criadora do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia. Contou ainda com diversos representantes indígenas e de comunidades tradicionais e de ativistas de áreas periféricas das cidades do país. A animação continuou no Egito, com representantes brasileiros dos mesmos grupos e, desta vez, de lideranças políticas e ambientais nacionais recém-eleitas, como Marina Silva e Luiz Ignácio Lula da Silva.
O ambientalismo moderno não é tão recente quanto se poderia pensar. Muitos identificam o seu começo na publicação do livro Primavera Silenciosa, de Rachel Carson, em 1962, nos Estados Unidos. A obra, hoje clássica, documenta os estragos causados pelo uso indiscriminado de pesticidas na agricultura daquele país. Dez anos mais tarde, em 1972, foi organizada a primeira grande conferência da ONU a dar destaque ao meio ambiente, em Estocolmo, na Suécia. E, em 1992, deu-se sequência ao movimento com o lendário evento ambiental e climático, o Rio-92, também conhecido como o Earth Summit.
Hoje os eventos ambientais e do clima são cada vez mais frequentes, maiores e também espalhados por toda parte, inclusive pela internet. Tamanho entusiasmo pela questão ambiental resulta em parte da urgência da questão climática, que ameaça todos nós. Mas resulta também do seu lado B e utópico. Ou seja, quando resolvermos os desafios do aquecimento global a vida ficará melhor em todo o planeta, inclusive nas grandes cidades. Teremos trocado energias sujas e poluentes por outras, bem mais limpas. O ar estará mais gostoso de se respirar e os rios e riachos nos trarão águas cristalinas. A riqueza pública será cada vez maior e a desigualdade de renda cada vez menor. Será mais fácil e divertido ir de um ponto ao outro, em veículos elétricos silenciosos e divertidos, como bicicletas e triciclos e scooters. A comida poderá ser mais fresca e saborosa, colhida perto de casa, em hortas urbanas ou até mesmo em edifícios.
O clima, sabemos hoje, é o nosso bem mais precioso. Se não cuidarmos dele, chove demais e tudo de uma vez, gerando enchentes, ou chove de menos e aí corremos o perigo de ficar sem água e perder plantações. Um clima em desequilíbrio ameaça a vida e a infraestrutura construída antes do aquecimento e também conquistas da modernidade, como o sistema de transporte e a economia globalizados.
Felizmente existem muitas soluções para o desequilíbrio climático. Uma descoberta recente é a de que a concentração da riqueza nas mãos de poucos cobra um preço alto do sistema climático do nosso planeta. Os 1% de pessoas mais ricas, sejam elas do Brasil, dos Estados Unidos ou da China, emitem 70 vezes mais gases de efeito estufa do que os 50% menos favorecidos do mundo. E são esses os gases que colocam o clima do planeta em desequilíbrio.
Uma das soluções para este desafio é redistribuir a riqueza particular através da construção de bens públicos dos quais todos podem usufruir. Um belo parque custa pouco ou nada para o clima e melhora a vida de muitos e da própria sociedade, para dar um exemplo. As árvores do parque ainda retiram do ar um pouco da poluição e gases de efeito estufa, resfriam o clima e oferecem sombra, de grande valia em tempos de calor crescente.
A educação é fundamental também para controlar o aquecimento global. Afinal, são as pessoas que vão ter que construir novos modos de vida e tecnologias menos poluentes. Para que nós entendamos as melhores maneiras de proceder serão necessárias muitas discussões, aulas e pesquisas. É preciso falar do assunto e estudar as soluções. As pessoas terão que aprender a gerar riqueza sem poluir e porque isto é tão importante. Daí o papel primordial dos Centros Culturais e de convivência.
Neles, é possível aprender como reflorestar e cultivar comida dentro das grandes cidades. São locais como esses que podem promover um novo urbanismo, baseado em mobilidade limpa, transporte público, e espaços abertos ao público e cheios de árvores. Eles poderão engajar a população na preservação de biomas como a Amazônia e a Mata Atlântica, que são imprescindíveis à vida e ao clima.
Temos pouco tempo. O aquecimento global nos deu um prazo para criarmos sociedades melhores. Refazer a economia e a sociedade é para frear a mudança do clima e se adaptar a ela é a grande tarefa das próximas décadas.
Matthew Shirts é jornalista e escritor. Acaba de lançar o livro “Emergência climática: o aquecimento global, o ativismo jovem e a luta por um mundo melhor”. É um dos fundadores da plataforma @fervuranoclima. Foi colunista de O Estado de S. Paulo, VejaSP e BandnewsFM e editor-chefe de National Geographic Brasil e Planeta Sustentável.
Caco Galhardo é cartunista, tem 12 livros publicados, uma tira diária na Folha de São Paulo e personagens que já foram adaptados para séries de TV, como “Lili A Ex”, no canal GNT. É um dos fundadores da plataforma @fervuranoclima. Também escreve para cinema, TV e teatro.
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