03/08/2024
Por Marina Barroso
Unindo território e pessoas, convidamos o ilustrador Alexandre de Maio para representar a Zona Norte da capital paulistana e o entorno que contempla o Sesc Casa Verde.
Por toda a cidade de São Paulo, é possível encontrar traços culturais de diversas populações que pavimentaram e promoveram a cidade a ser essa grande metrópole brasileira.
Na Casa Verde, tradicional bairro da Zona Norte, com ocupação territorial desde o século XVII e seus sítios e chácaras, a história não é diferente. Ao chegar ao território, junto aos bairros de Cachoeirinha, Bairro do Limão, Jardim São Bento e Parque Peruche, o Sesc soma com toda a tradição que guarda memórias, traços culturais e o legado de diversas populações: a população negra oriunda das regiões centrais, como Bixiga e Barra Funda, migrantes nordestinos, imigrantes europeus e japoneses e, em um processo mais recente, imigrantes latino-americanos.
Alexandre de Maio, repórter e ilustrador nascido e criado na Zona Norte paulistana, enaltece, através de seus traços artísticos, alguns espaços e personalidades fundamentais para a história do território, despertando olhares não somente para locais ditos “turísticos”, mas também para aqueles vinculados à memória afetiva dos moradores da cidade. Conheça mais sobre esses espaços e personalidades a partir das ilustrações do artista.
A ocupação do território, que data do século XVII, se dá em primeira instância pela residência do administrador da Capitania de São Vicente, Amador Bueno. Transferidas as terras para José Arouche Rendon e suas irmãs, o terreno tem sua primeira referência que futuramente nomeará o bairro, sendo conhecido pelo “sítio das moças da casa verde”, dada a cor da casa a qual elas residiam nestas terras utilizadas para o cultivo de café.
Um dos vestígios dessa longínqua ocupação é a instalação do Sítio Morrinhos, um conjunto arquitetônico composto pela casa-sede, com construção datada de 1702, e por diversas construções anexas de temporalidades diversas. Com características singulares da arquitetura bandeirista e a utilização da técnica taipa de pilão, foi uma residência rural servindo como sede de sítio de propriedade da família Baruel.
De um amplo espaço, foram realizados loteamentos a partir da década de 1950 que originou o bairro Jardim São Bento, preservando-se a estrutura secular do Sítios Morrinhos que a partir de 2000 passa por restauração e conservação, abrindo para visitação ao público em 2008 e abrigando hoje o Centro de Arqueologia de São Paulo, vinculado ao Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura.
Em meados do século XX, diversas famílias expandem a cidade de São Paulo na configuração de novos bairros em consequência ao processo de especulação imobiliária na região central, como Barra Funda e Bixiga. Ocupando a outra margem do Rio Tietê, famílias majoritariamente negras se instalam no Parque Peruche, acompanhadas por uma grande articulação sociocultural, que foi fundamental para a formação da identidade negra do território.
Recebendo o nome de Pequena África Paulistana, na Casa Verde e em seu entorno firmaram ilês de candomblé, terreiros de umbanda, grupos de capoeira e afoxés e, a partir desse terreno de axé, se torna o epicentro da cultura carnavalesca de São Paulo.
Em 1980, a Iyalorixá Wanda de Oxum e o Ogã Gilberto de Exu fundam o Afoxé Filhos da Coroa de Dada, nascido dentro de um espaço sagrado e de culto aos orixás. O Afoxé, que no Brasil designa uma espécie de bloco carnavalesco e faz correspondência aos cortejos reais iorubás, ficou responsável pela abertura do desfile oficial das escolas de samba do Grupo Especial de São Paulo, realizando a lavagem do sambódromo do Anhembi para lembrar que a festa, embora profana, também é sagrada e reverencia aos orixás. O Sambódromo do Anhembi, como é popularmente conhecido, é um espaço importante que coroa a tradição do Carnaval no território, projetado por Oscar Niemeyer e inaugurado em 1991.
O Centro de Tradições Nordestinas, fundado em 1991, se tornou um dos maiores espaços de difusão e ponto de encontro de migrantes, com concentração de restaurantes tradicionais, feira de artesanato, apresentações musicais e diversos espaços que remetem à cultura popular brasileira.
O espaço não passa despercebido por quem circula pelo bairro do Limão: o grande pórtico em formato de chapéu de couro faz referência à cultura dos vaqueiros, difundida pelo cangaço e as três imponentes estátuas de músicos tocando triângulo, sanfona e zabumba fazem referência ao forró e revelam a atmosfera de acolhimento e a valorização de elementos da cultura tão diversa presente nos nove estados que compõem a região nordestina. O CTN se espalha pelos 27 mil/m², com capacidade de receber 70 mil pessoas por mês.
Em outubro de 2023, o Sesc chega à Zona Norte abrindo as portas para se tornar uma nova referência em cultura, lazer e esporte na cidade, fazendo uma grande reverência às pessoas, expressões artísticas e religiosas e personalidades célebres presentes e atuantes do território.
O Sesc chega para ocupar um conjunto predial de grande expressão para o bairro que, por longo tempo, foi ocupado pelo Grupo Guararapes em suas mais diversas frentes; uma estrutura que diversos moradores do território conhecem e se identificam, sejam por memórias trabalhistas, familiares ou de referências geográficas. Com o intuito de ressignificar o caráter inicial da estrutura para se transformar em uma opção cultural e desportiva, de promoção de bem-estar e qualidade de vida aos trabalhadores do setor de comércio de bens, turismo e serviços e suas famílias e demais públicos, a Unidade da Casa Verde surge com o intuito de estabelecer diálogo permanente com a comunidade local e de reconhecer a riqueza histórica e cultural da Zona Norte.
Alexandre de Maio começou sua carreira no jornalismo editando revistas de Hip-Hop de 1999 a 2009. Desde então, sua trajetória profissional perpassou por lançamento de livros, direção de videoclipes e animação para produções audiovisuais. Hoje é Diretor de Audiovisual e Projetos do site Catraca Livre, onde atua desde o início da plataforma, e atua na Salve Studio, sua desenvolvedora de games.
Textos de referência:
GIULIA TRECCO. Sítio Morrinhos: arquitetura bandeirista na Zona Norte de SP. 2021. Disponível em: < https://saopaulosecreto.com/sitio-morrinhos-zona-norte-de-sp/> Acesso em 26 de abril de 2024.
SHAGALY FERREIRA. Centro de Tradições Nordestinas: conheça a história do empreendimento que homenageia o Nordeste em SP. 2023. Disponível em: <https://revistapegn.globo.com/empreendedorismo/noticia/2023/10/centro-de-tradicoes-nordestinas-conheca-a-historia-do-empreendimento-que-homenageia-o-nordeste-em-sp.ghtml> Acesso em 26 de abril de 2024.
SITE AFOXÉ OMO DADA. Carnaval 2012: Afoxé Filhos da Coroa de Dadá abre o segundo dia de desfiles em São Paulo. 2012. Disponível em <https://afoxeomodada.wordpress.com/>. Acesso em 25 de abril de 2024.
SITE ALEXANDRE DE MAIO. Biografia. s/d. Disponível em: https://alexandredemaio.com.br/bio. Acesso em 07 de agosto de 2024.
SITE CENTRO DE TRADIÇÕES NORDESTINAS. Sobre Nós. S/d. Disponível em: <https://www.ctn.org.br/sobre-nos/>. Acesso em 26 de abril de 2024.
SITE MUSEU DA CIDADE. Sítio Morrinhos/MCSP. S/d. Disponível em < https://www.museudacidade.prefeitura.sp.gov.br/sobre-mcsp/sitio-morrinho> Acesso em 26 de abril de 2024.
SITE NOITE DE TAMBORES. Afoxé Ilê Omo Dada. S/d. Disponível em: <https://noitedostambores.com/?p=2929>. Acesso em 26 de abril de 2024.
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