Leia a edição de janeiro/23 da Revista E na íntegra
Por Luna D’Alama
Como você tem passado o seu tempo livre? O que tem escolhido fazer nos momentos de lazer? Gosta de praticar atividades ao ar livre, que estimulem o movimento do corpo, ou prefere ficar nas redes sociais, quem sabe maratonando filmes e séries? Aliás, qual é a sua concepção de lazer? Para estudiosos do tema, o lazer é uma dimensão da cultura humana – e não uma atividade propriamente dita – que envolve elementos como tempo, espaço, atitude e manifestações culturais. Esse fenômeno implica, de acordo com o sociólogo francês Joffre Dumazedier, três Ds: descanso, divertimento e desenvolvimento.
Segundo a pesquisa A dimensão tempo na gestão das experiências de lazer em período de pandemia da Covid-19 no Brasil, publicada em setembro de 2020 pela revista Licere, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a maioria (79%) dos 2.278 participantes (adultos de todos os estados e do DF) declarou dispor de tempo para o lazer naquele momento de isolamento social. Desse total, 54% afirmaram que suas experiências de lazer, porém, haviam diminuído se comparadas ao período pré-pandemia. Nesse estudo, o lazer foi dividido em sete categorias: virtual, intelectual, manual, artístico, turístico, físico-esportivo e social.
“Com o fechamento de academias, clubes e parques, trabalho remoto, afazeres domésticos e o cuidado com filhos e familiares, muitas pessoas tiveram seu tempo de lazer reduzido. Mas, entre os que se mantiveram ativos mesmo dentro de casa, 80% usaram o quintal ou fizeram adaptações em cômodos, nas sacadas, garagens e até em corredores para praticar ginástica, yoga e meditação. Muitos, inclusive, compraram acessórios para fazer exercícios, como colchonetes, pesos e esteiras ou bicicletas ergométricas – assim como muita gente adquiriu, por outro lado, cadeira gamer, home theater e jogos de videogame”, descreve Ana Paula Teodoro, doutora em ciências da motricidade pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e coordenadora do Laboratório de Gestão das Experiências de Lazer (Lagel/Gesporte), da Universidade de Brasília (UnB), que realizou a pesquisa.
Entre as atividades físicas mais citadas, estavam, nesta ordem: meditação, zumba, ciclismo, dança, musculação, corrida e natação. “Aqueles que alegaram não praticar exercícios nem ter muitos momentos de lazer citaram a falta de tempo como principal fator. Além disso, a linha entre trabalho remoto e lazer está cada vez mais tênue e difícil de ser contabilizada, pois, enquanto eu trabalho, posso ver um vídeo ou interagir numa rede social. Esses tempos se fundem e, cada vez mais, fica difícil falar numa separação cronológica deles”, analisa.
De acordo com a pesquisadora, o estudo também revelou um aumento no uso da internet e das telas, aparecendo nas respostas de quase todas as categorias de lazer. “As pessoas mencionaram que participavam de chamadas de vídeo com amigos e familiares, aniversários online, aulas remotas de dança e ginástica, jogos de videogame, lives de artistas e leituras digitais, além de assistir a filmes, séries e vídeos diversos (de culinária, artesanato, jardinagem etc.)”, enumera. Ela também acrescenta que já faz mais de duas décadas que as tecnologias vêm promovendo alterações significativas nas dinâmicas sociais, mas isso ficou ainda mais evidente a partir do período de pandemia. “A casa não é mais um espaço isolado do mundo. As pessoas estão o tempo todo conectadas com o ambiente externo.”
IMPACTOS DO EXCESSO
Desde a pré-pandemia até o primeiro trimestre de 2022, houve uma queda de 21% entre os brasileiros que declararam se exercitar toda semana, chegando a um terço da população (71 milhões de pessoas). É o que revela o estudo Covitel, feito em 2021 pela organização Vital Strategies, em parceria com a Universidade Federal de Pelotas (UFPel). O levantamento avaliou 18 indicadores de saúde (como prática de atividade física no tempo livre e consumo de alimentos in natura), além de fatores de risco para doenças crônicas (excesso de peso, tabagismo, uso de álcool e tempo de tela).
Para tentar reverter esse cenário, nos últimos dois anos a Organização Mundial da Saúde (OMS) dobrou sua recomendação semanal de atividade física moderada ou vigorosa: de 150 para 300 minutos (ou 5 horas). E o excesso do tempo em frente a telas também pesa nessa conta. Além do sedentarismo, o uso de celulares, tablets, notebooks e televisores acima do limite considerado saudável favorece a má qualidade do sono, a redução nas relações interpessoais, a superestimulação da atenção e a subestimação intelectual, segundo o pesquisador francês Michel Desmurget, especializado em neurociência cognitiva e autor de livros sobre o tema.
Para Cassio Meira Jr., doutor em educação física pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, há um número cada vez maior de crianças e adolescentes sedentários por causa das telas. “Muitos adolescentes viram noites em maratonas de jogos online e acabam tendo problemas de sono e não conseguindo controlar a ansiedade de jogar. Além disso, temos visto um aumento de problemas motores, posturais, oftalmológicos e de saúde mental, de vício mesmo, em que a pessoa não consegue sair da frente da tela”, relata.
A psicóloga clínica e do esporte Thabata Telles, pós-doutora em educação física e esporte pela USP e vice-presidente da Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (Abrapesp), complementa que o uso excessivo de telas, seja para lazer ou trabalho, acaba trazendo impactos negativos à saúde física e mental. “Do ponto de vista dos neurotransmissores, o excesso de tempo gasto nas redes sociais, por exemplo, está relacionado a um boom de dopamina. Isso faz com que você tenha uma sensação de prazer constante, porque o algoritmo filtra coisas que têm a ver com o que você gosta e visualiza. Para sair desse ciclo, é muito complicado”, diz.
Segundo a psicóloga, estamos ensinando nossos corpos a permanecerem sentados, em posturas estáticas, por longos períodos. “É como se a gente estivesse se desacostumando a se movimentar. Estamos criando um hábito de ficar muito tempo parados na frente das telas. Toda a nossa relação com o corpo e com o movimento é aprendida ao longo da vida. A gente ‘informa’ ao corpo [e ao cérebro] o que vale a pena fazer. Se eu digo o tempo inteiro que a melhor forma de me divertir é estar parado, então vou ter que fazer um esforço muito maior para sair da inércia, mesmo que seja uma simples caminhada”, considera.
Thabata reforça que a atividade física também libera hormônios ligados ao prazer e ao bem-estar, como serotonina, endorfina e dopamina, mas que primeiro é preciso se movimentar e se expor ao desconforto. “Há estudos que falam da importância de olharmos para o horizonte, de ampliarmos nosso campo de visão, para aumentar nossa percepção de mundo e nossos movimentos. Quando andamos ou passeamos por uma cidade, ampliamos essa capacidade, por meio das coisas que vemos, ouvimos, cheiramos e sentimos na pele, como o frio, o calor e a chuva”, explica.
TECNOLOGIA COMO ALIADA
Quando utilizadas de maneira adequada e por períodos limitados, as telas podem oferecer vantagens à prática esportiva. Segundo a pós-doutora em educação física e esporte Thabata Telles, há aplicativos e aparelhos que ajudam a medir a frequência cardíaca, o gasto calórico e a qualidade do sono, entre outros indicadores. “Planilhas, vídeos, apps, consultas online e o acompanhamento remoto de personal trainers têm facilitado o acesso de pessoas à prática de exercícios. Mas acho importante haver um equilíbrio entre o on e o offline”, ressalta. Segundo o professor Cassio Meira Jr., também há jogos de videogame que propiciam movimentos amplos do corpo, fazendo os participantes mexerem pernas, braços e quadris e, com isso, a atividade física vai sendo estimulada dentro de casa.
Para a pesquisadora Ana Paula Teodoro, as novas tecnologias também podem auxiliar nas aulas de educação física, com diversas opções que estimulam a prática de atividades físicas, como caça ao tesouro pelo WhatsApp, jogos que utilizam o Instagram e permitem interação, Pokémon GO, Among Us e até quadribol do Harry Potter. “O professor não precisa saber jogar, mas entender a realidade dos alunos, do que eles gostam, e trazer isso para suas aulas. Participo de oficinas e cursos pelo Brasil para falar sobre webgames que envolvem o corpo e o uso de tecnologias durante as aulas”, diz.
Uma das propostas que aliam esporte e tecnologia é o canal @esportesescsp, iniciativa do Sesc São Paulo presente, desde 2020, no Instagram e, um ano depois, no YouTube. Nesses canais virtuais, o público encontra dicas, aulas e informações sobre esporte e atividade física para ter uma rotina mais ativa. As publicações, compostas por vídeos curtos, lives, aulas abertas e até cursos mais longos, todos gratuitos, apostam em temas como coordenação motora, exercícios aeróbicos, de força e condicionamento, modalidades esportivas, práticas corporais, dança, meditação e respiração. “A tecnologia pode ser uma porta de entrada para as pessoas experimentarem novas práticas. São conteúdos que podem ser adotados no dia a dia, para um treino mais completo”, destaca Andrea Toledo, assistente da Gerência de Desenvolvimento Físico-Esportivo do Sesc São Paulo.
Focado em atividades presenciais, Sesc Verão 2023 deseja atrair o público com vasto leque de opções e incentivá-lo a aderir a exercícios físico-esportivos no dia a dia
De 7 de janeiro a 12 de fevereiro, o Sesc São Paulo promove, em todo o estado, o Sesc Verão 2023. Com o tema Pratique onde estiver! Como quiser!, a 27ª edição convida o público a participar das mais de 1300 ações, todas gratuitas, e assim refletir sobre a importância de incluir exercícios em sua rotina diária.
“Por meio de uma programação intensa, diversificada e predominantemente presencial, o Sesc Verão 2023 busca oferecer o maior número possível de atividades para incentivar as pessoas a encontrarem a prática que melhor se encaixe no seu perfil e, assim, manter-se em movimento dentro e fora das unidades do Sesc. Queremos que o público entenda os benefícios da atividade física e aprenda a administrar bem o seu tempo, para incluir esse momento de autocuidado no dia a dia”, destaca Carol Seixas, gerente da Gerência de Desenvolvimento Físico-Esportivo do Sesc São Paulo. Conheça a programação completa: sescsp.org.br/sescverao.
Araraquara
Vivência de natação para pessoas cegas
O ex-atleta paralímpico Alex Viana Palhares ensina adaptações necessárias para a participação de pessoas com deficiência visual nessa atividade aquática.
De 7 a 10/2, das 16h às 17h. GRÁTIS.
Consolação
Corrida no Minhocão
A ultramaratonista e personal trainer Isadora Martins conduz essa atividade integrativa para estimular a prática inclusiva e prazerosa da corrida no dia a dia.
Dia 12/2, domingo,
das 8h às 10h. GRÁTIS.
Pompeia
Apresentação esportiva de skate, com Sandro Dias
Mineirinho, como é conhecido, é hexacampeão mundial pela World Cup Skateboarding, tricampeão brasileiro e tricampeão do circuito europeu. Foi medalhista em X Games por mais de dez vezes e é conhecido por sua habilidade de “voar” com o skate, sendo o terceiro skatista da história a executar uma manobra de 900° (dois giros e meio no ar).
Dia 7/1, das 14h30 às 16h30. GRÁTIS.
Guarulhos e Mogi das Cruzes
Ginástica para todos, com Rebeca Andrade
Bate-papo, apresentação e vivência esportiva com a atleta da seleção brasileira de ginástica artística, medalhista de ouro e prata nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021.
Dia 7/1, das 10h às 12h (Mogi das Cruzes) e das 15h30 às 17h30 (Guarulhos). GRÁTIS.
Santos
A prática esportiva e a importância da vida ativa, com Marcio Atalla
Palestra com o preparador físico, consultor e comunicador especializado em saúde e bem-estar. Atalla é pós-graduado em nutrição pela Universidade de São Paulo (USP) e atua no treinamento de alto rendimento.
Dia 11/1, das 20h às 21h30. GRÁTIS.
Santo Amaro
Apresentação e vivência de vôlei de areia, com Jacqueline Silva
A ex-atleta e campeã olímpica oferece aos participantes a oportunidade de entrar na quadra de areia e experimentar essa modalidade.
Dia 14/1, das 11h às 14h. GRÁTIS.
A EDIÇÃO DE JANEIRO/23 DA REVISTA E ESTÁ NO AR!
No mês em que acontece o Sesc Verão 2023, discutimos a relação entre as tecnologias e a prática físico-esportiva. A reportagem principal desta edição defende que usar o tempo livre para atividades que não movimentam o corpo favorece o sedentarismo, além de elevar o risco de doenças crônicas. No entanto, o texto também aponta que, quando utilizado de maneira equilibrada, o tempo em frente às telas pode motivar a prática de atividades físicas, por meio do uso de aplicativos e aparelhos que medem frequência cardíaca, gasto calórico, qualidade do sono, entre outros indicadores.
Além disso, a Revista E de janeiro/23 traz outros conteúdos: uma reportagem que percorre os caminhos de gestação de uma obra literária, desde o surgimento da ideia original até chegar à mão dos leitores; uma entrevista com a escritora cubana Teresa Cárdenas, que conta sobre sua relação com a literatura brasileira, seu processo criativo e revela de que forma os antepassados guiam sua escrita; um depoimento com a cantora e compositora Ellen Oléria sobre música, teatro e afrofuturismo; um passeio visual por imagens que celebram o universo feminino indígena no universo das artes visuais; um perfil da médica Nise da Silveira (1905-1999), pioneira na humanização do atendimento psiquiátrico por meio da arte; um encontro com o jornalista Tiago Rogero, criador do projeto Querino, que fala sobre popularização de podcasts e luta antirracista no Brasil; um roteiro nostálgico pelas miudezas arquitetônicas de São Paulo, em celebração aos 469 anos da capital paulista; um conto inédito da escritora Natalia Timerman; e dois artigos que discutem a relação entre envelhecimento e inclusão digital.
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